Do diário de Harriet LOW (1)
“6 de Agosto de 1830:
Desejaria dar-te a mais pequena ideia duma procissão que passou aqui esta tarde. Parece que estão a dedicar uma nova igreja ou pagode e fazem grande alarido na cidade. Mas, ainda que enchesse muitas páginas, receio que não te poderia dar uma boa ideia dela.
Em primeiro lugar, não se pode calcular o seu comprimento e a variedade de objectos, vestidos, música, etc. …
Muitos dos vestidos eram esplêndidos, com cores e materiais que podes imaginar, mas num estilo que não pode agradar aos olhos de qualquer pessoa dotada de bom gosto.
Havia mulheres esplendidamente adornadas, montadas em cavalos, indo escarranchadas; rapazinhos ataviados com os chapéus e vestidos mais grotescos, empunhando bandeiras trabalhadas com todo o esplendor e de todas as cores.
Iam crianças suspensas no ar e até parecia que se não apoiavam em coisa nenhuma, tal a forma engenhosa como havia sido aquilo disposto.
Havia ainda uma pequena Vénus, saindo da sua concha, e milhões de outras coisas de que não me posso lembrar.
E então a música! Música, disse eu? Ó céus! Se sons tão dissonantes se podem chamar música, aquilo deve ser o supra-sumo da perfeição, pois não podia haver maior ruído; os gongos batiam horrivelmente de sorte que não se podia ouvir de pessoa alguma, ainda que estivesse perto. Oh! Não devo esquecer-me dos porcos tão interessantes! Pobres porcos assassinados, assados e besuntados para essa ocasião, e levados nos carros.
Havia um cordeiro, pobre animalzinho, todo tosquiado, e colocado num carro como se ainda estivesse vivo.
Seguia-se um porco pronto para ser cortado, outro assado e outro besuntado.
Olha que em todas as procissões de casamento, nos funerais, e não sei que mais, são sacrificados os pobres e inocentes porcos.
Seguiam-se carros cheios de fruta – presentes aos deuses como suponho.”
Macau. 1832.
Gravura de W. Floyd dum desenho de W. Purser. Colorido à mão. (2)
(1) Segundo Padre Teixeira (1) esta procissão seria a “festa anual de T´in Hau” (天后/Mazu/A Má), Imperatriz do Céu Deusa dos Mares/Pescadores, protectora dos pescadores e dos navegantes que ainda hoje em Hong Kong se celebra em Agosto, assistindo até o governador”. (TEIXEIRA, Padre Manuel – Macau no Séc. XIX visto por uma jovem americana, 1981, p. 38/39.
A Procissão/Festival em honra a T´in Hau – 天后, em Hong Kong, desde 1963, celebra-se no 23.º dia do 3.ª mês lunar do ano (entre finais de Março e Maio dependendo do calendário lunar).
T´in Hau é a protectora do Pagode Da Barra e de grande devoção dos pescadores de Macau.
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/templo-tin-hau-coloane/
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/templo-tin-hau-macau/
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/templo-tin-hau-taipa/
(2) Esta mesma pintura já foi apresentada em anterior postagem com a indicação de “Macau, 1935”
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2016/04/06/quadros-19th-century-macau-prints-iv-pintura-de-auguste-borget-e-robert-elliot/
Esta indicação “Macao, 1832” retirei-a de:
http://www.antique-prints.de/shop/catalog.php?list=KAT08&seg=2