A 22 de Julho de 1828, o procurador do Senado, Joaquim José Ferreira da Veiga publicou um edital, proibindo a abertura de uma casa de despejo para o negócio, no chalé de Matapau, (1) pertencente a António Pereira, (2) por ser chamariz de vadios com prejuízo para todos os vizinhos.
A 5 de Novembro de 1834, arderam todas essas barracas, segundo consta do ofício do procurador de Macau, António Pereira, do dia seguinte, aos mandarins do distrito: «Verificou-se no incêndio de ontem à noite, tudo o que eu e meus antecessores disseram ao Snr. Mandarim, de que as barracas da Praia Pequena e outras deram ocasião ao incêndio, pelo qual perigavam a existência do estabelecimento, as vidas e os bens; e com efeito os haos (lojas) chinas de muitas e valiosas fazendas, os matapaus e todas as propriedades chinas da beira-mar incendiaram-se; a e a minha própria casa principiou a incendiar-se, sendo de tudo a causa as barracas do mar».
Pedia que não se construíssem ali mais.
A 17 de Mesmo mês, o procurador insistia com o mandarim Tsó-tang que os matapaus, que estavam dentro da cidade, se mudassem para Patane.
A 19 de Janeiro de 1835, novamente o procurador João de Deus Castro chamava a atenção do mandarim para o perigo de incêndio dessas barracas; e a 8 de Janeiro de 1936, o Procurador Francisco José de Paiva insistia no mesmo assunto, dizendo que os chinas estavam construindo barracas junto à propriedade de António Pereira no Matapau. (3)
(1) Matapau é uma planta da família das gutíferas – tangerinas como indica o nome chinês da Rua do Matapau (1)- Kat Chai Kai ( 桔仔街 ), isto é, Rua da Tangerina. Aos vendedores de tangerinas dava-se o nome de Matapáus, os quais estabeleceram nesse local as suas lojas ou barracas.
A Rua do Matapau fica situada entre a Avenida de Almeida Ribeiro e a Rua da Barca da Lenha, começando um pouco antes da Travessa de Hó Ló Quai, junto do tardoz do prédio n.º 63 da Avenida Almeida Ribeiro e terminando entre o prédio n.º 106-B da Rua dos Mercadores e o prédio n.º 2 da Travessa do Aterro Novo.
(2) António Vicente Pereira, filho do Conselheiro Manuel Pereira e de Ana Pereira Viana (3) ou Rosa Pires Viana (4) era casado com Aurélia Susana Viana Mendes, filha de Mateus Mendes e de Maria Mendes (3) ou Mónica Viana (4), de quem teve onze filhos. O Conselheiro Manuel Pereira (1757 – 1826) chegou a Macau entre 1772 e 1780, grande negociante da praça de Macau, fundador, tesoureiro e vice-presidente da «Casa de Seguros de Macau», provedor da Santa Casa da Misericórdia (1798-1806) juiz ordinário da Câmara de Macau (1798) , procurador do conselho 81801, 1804 e 1808) e vereador durante muitos anos. Fidalgo cavaleiro da Casa Real, conselheiro de Sua Magestade entre outros títulos da nobreza, comprou a propriedade onde se encontrava a Gruta de Camões e comprou e colocou aí o primeiro busto do poeta.(4)
(3) TEIXEIRA, P. Manuel – Toponímia de Macau, Volume I, 1997.
(4) FORJAZ Jorge, Famílias Macaenses, Volume II, 1996.
NOTA: Embora os caracteres chineses da Rua do Matapau sejam: 桔仔街 – mandarim pīnyīn: xié zǐ jié; cantonense jyutping: gat1 zai2 gaai1, os caracteres de “tangerina” são 橘子 – mandarim pīnyīn: jú zǐ,; cantonense jyutping:qwat1 zi2
Junto à entrada está o deus-porteiro
Que não deixa entrar diabos e ladrões,
E àquela que abra e saia dos portões
Assegura que volte são e inteiro
Na sala está o buda folgazão
Enchendo a casa de luz da alegria
E p´ra que nunca falte arroz do dia
Na cozinha está o deus do fogão.
Fotografia tirada na Rua do Matapau em Maio de 2017
Trabalha o patrão numa grande mesa
E entre ábacos e livros aos montões,
Majestoso se ergue o deus da riqueza.
Na alcova está a deusa das paixões
Para dar ao casal toda a certeza
De dar ao seu lar novas gerações.
Leonel Alves (1) (2)
(1) In “Antologia de Poetas de Macau”, selecção e organização de Jorge Arrimar e Yao Jingming, 1999, p.81.
(2) Ver anterior referencia a este poeta em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/leonel-alves/
“Um horrível incêndio, como nunca se viu em Macau, teve princípio à 1.45, numa das boticas chinas do Bazar. Ajudado pelo vento norte, o fogo espalhou-se com grande rapidez. O vento, mudando, às 5.00 horas, para leste, fez avançar o incêndio sobre as boticas de Matapau. (1)
À 6.30 horas, voltando, outra vez, para o norte, fez com que a terrível conflagração seguisse pela Travessa de S. Domingos, Rua do Quintal e Travessa do Tronco, escapando, por pouco, o antigo convento de S. Domingos. O incêndio durou toda a noite, destruindo 420 boticas (lojas) e 400 residências de famílias chinesas, subindo a mais de meio milhão de patacas, o valor de propriedades destruídas. Os cidadãos de Macau auxiliaram, por toda a forma possível, a combater o incêndio, tendo prestado valiosos socorros as guarnições das fragatas francesas Virginie e Constantine. (2)
(1) MATAPAU – planta clusiácea do Brasil ( Dicionário Cândido de Figueiredo)
A propósito da Rua do Matapau (3), retiro do artigo do jornalista e investigador João Guedes o seguinte:(4)
“Tal é o caso da Rua do Matapau que em chinês é designada por “Kat Chai Kai”. (5) .Entre os dois vocábulos não existe qualquer diferença. Ambos designam as singelas tangerinas que nesse local eram vendidas, principalmente e época de Ano Novo lunar. Apesar do lirismo, porém, a Rua do Matapau, situada em pleno coração do bazar do século XIX, deixou para nós uma aura de mistério. Era ali que não só os vendedores de flores e tangerinas faziam o seu negócio, como também as “tríades” levavam a cabo as suas reuniões secretas. mas era também que o Governo exercia a justiça, consubstanciada nas chicotadas sobre os criminosos cujas gotas de sangue ressaltavam no largo lajeado onde desembocava a rua”
Era a Rua (também existe um Beco e uma Travessa com esse nome) onde estavam as lojas que vendiam tangerinas. Os vendedores eram conhecidos por “Matapáus”
(2) GOMES, Luís G. – Efemérides da História de Macau. Notícias de Macau, 1954, 267 p.
(3) Rua do Matapau – Cat Chai Cai (rua da tangerina)
桔子街 (jú zi jié; cantonense jyutping: gat1 zi2 gaai1)
Fica situado entre a Avenida de Almeida Ribeiro e a Rua da Barca da Lenha e vai dar à Rua dos Mercadores.
A zona do Matapau também é conhecida entre os chineses por Pun PIn Vai.
(4) Artigo “”Divergências e coincidências“publicado no Jornal Tribuna de Macau, de 31 de Maio de 2011 e também no blog do autor:
http://www.jtm.com.mo/view.asp?dT=376402001
http://temposdoriente.wordpress.com/sobre-macau/