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Ainda propósito duma postagem anterior, sobre “jerinxá/riquexó” (1)(2), recupero a referência que o Governador Álvaro de Mello de Machado deixou escrito no seu livro “Coisas de Macau” (1913), na p. 145, (3) sobre os meios de transportes de Macau nomeadamente sobre a “cadeira particular”.

“ Além do jrinksha, encontram-se em muito menor numero as cadeiras, espécie de pequenas liteiras, transportadas geralmente por dois homens, mas podendo-o ser por mais, conforme o gosto e o dinheiro de quem as usa.

A cadeira é muito empregada em Hong-Kong, onde pela natureza do terreno não é possível usar jrinksha na parte alta e na encosta da cidade. Em Macau, onde não há nem grandes nem muto ingremes ascensões a fazer, é mais um objecto de luxo, empregado como aparato nas grandes solemnidades. Assim, nos casamentos, é da praxe ir a noiva n´uma cadeira, como em geral vão também os convidados.

Cadeira particular

No interior da China, as grandes auctoridades fazem-se sempre transportar em cadeiras, que são levadas por grande numero de culis; e acompanhando esse costume os governadores em Macau, até ha pouco tempo, empregavam nas grandes solemnidades cadeiras transportadas por oito culis.

As estradas de Macau prestam-se admiravelmente ao uso das bicycletas; e por isso numerosos d´esses vehiculos circulam constantemente, principalmente às tardes, mas todavia mais como objectos de sport e de passatempo, do que como meio pratico de transporte.

Houve já, não há muito tempo, uma tentativa de emprego de automóveis, feita por um americano. Porem a volta da peninsula fazia-se em 20 minutos, e as estradas para a China são puco cuidadas e muito estreitas, tornando quasi desagradáveis os passeios; e portanto, tal systema de viação, não conseguiu impor-se ao publico, terminando.”

 (1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2021/07/10/leitura-jerinxa-riquexo-jrinksha/

(2) https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

(3) MACHADO, Álvaro de Mello – Coisas de Macau. Livraria Ferreira, 1913, 153 p.  https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/alvaro-de-melo-machado/

No dia 18 de Novembro de 1987, os «Correios e Telecomunicações de Macau / CTT MACAU» emitiram e puseram em circulação selos postais alusivos à emissão extraordinária “Meios de Transportes Tradicionais – 1. º Grupo“ e um bloco filatélico. Trata-se de uma continuação da emissão de selos sob o tema “Meios de Transporte “ iniciado em 1984 com os “Barcos de Pesca” e terminado com os “Hidroaviões” (estes já publicados em anteriores postagens (1) (2)

Os quatros selos desta emissão são nos valores de 10 avos (carro de mercadorias), 70 avos (cadeirinha) 90 avos (riquexó) e 10 patacas (triciclo) (3)

Um dos meios de transporte mais antigo e comum usado na china e em Macau foi a cadeirinha portátil. Sustentada por dois varais compridos, era conduzida por dois homens, um colocado atrás e outro à frente. Foi usada principalmente nas cidades e no campo em pequenas distâncias. A cadeirinha foi durante a maior parte da história de Macau o meio de transporte mais importante e típico”. (4)

O Bispo de Macau tinha ao seu serviço quatro cadeirinhas, reservando uma para cada estação do ano. (5)

(1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2020/10/22/noticia-de-22-de-outubro-de-1984-filatelia-barcos-de-pesca/https://nenotavaiconta.wordpress.com/2017/10/25/noticia-de-25-de-outubro-de-1985-filatelia-barcos-de-carga/https://nenotavaiconta.wordpress.com/2020/08/28/noticia-de-28-de-agosto-de-1986-filatelia-1-o-dia-de-circulacao-meios-de-transporte-barcos-de-passageiros/https://nenotavaiconta.wordpress.com/2020/07/15/noticia-de-15-de-julho-de-1988-filatelia-meios-de-transportes-tradicionais-2o-grupo/https://nenotavaiconta.wordpress.com/2016/10/09/noticia-de-9-de-outubro-de-1989-1-o-dia-de-circulacao-meios-de-transpor-tes-tradiconais-hidroavioes/https://nenotavaiconta.wordpress.com/2019/10/09/noticia-de-9-de-outubro-de-1989-1-o-dia-de-circulacao-meios-de-transpor-tes-tradiconais-hidroavioes-ii/

(3) Portaria n.º 143/87/M de 9 de Novembro (BOM n.º 45, 1987, p. 2943) – Emite e põe em circulação selos postais e blocos alusivos aos “Meios de Transportes Terrestres Tradicionais”

(4) Texto de Jorge Cavalheiro in “Da Sampana ao Jactoplanador, Da Cadeirinha ao Automóvel”. Edição da Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau, 1990, 114 p.

(5) “O palanquim do Bispo de Macau tinha janelas de vidro e decorado com madrepérolas. Não há nenhum que ouse ser tão belo ou que se lhe possa comparar “ «Ou-Mun Kei-Leok Monografia de Macau», tradução de Luís Gonzaga Gomes, Outubro de 1979, p. 228.

Anteriores referências a triciclos e riquexós em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/triciclos/ https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

Extraído de «A Liberdade»,  I- 7 de 30 de Agosto de 1890, p. 3

Referências anteriores dos jinricshas/riquexós e às ruas de S. Lourenço e do Bazarinho, ver em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/ https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/rua-de-s-lourenco/ https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/rua-do-bazarinho/

A propósito duma postagem anterior, sobre “jerinxá/riquexó” (1), recupero a referência que o Governador Álvaro de Mello de Machado deixou escrito no seu livro “Coisas de Macau” (1913), na p. 144, (2) sobre os meios de transportes de Macau nomeadamente sobre o “Jrinksha” (grafia do autor)

Jrinksha particular das casas senhoriais da Praia Grande

O meio de transporte mais adaptado em Macau é o jrinksha, ligeiro veículo a duas rodas puxado por um chinez. A pequenez da cidade não comporta as velocidades das carruagens e dos automóveis, e d´ahi a ausência quasi completa de semelhantes vehiculos, que representariam um luxo demasiado caro, quasi sem aplicação” (3)

“ É pois o jrinksha, que invade todas as ruas, circula em todas as direcções, já barulhento e desconfortável rodando ao passo cançado do seu mal alimentado conductor, já elegante, airoso, resplandecendo metaes, deslisando suave sobre os seus aros de borracha, agilmente impelido pelos músculos fortes de dois reforçados rapazes. Todas as pessoas, que vivem com um certo desafogo, possuem um jrinksha que as transporta para toda a parte. (4) E assim, dando largas á fantasia, ao gosto, ou ao espirito de ostentação, o ligeiro carrinho e os seus conductores percorrem todas as escalas, d´este o imundo vehiculo de praça ao bello exemplar acharoado, que o Japão fabrica para preços caros, puxado pelos culis vistosamente enfarpelados, anunciando ao longe as côres a identidade da pessoa que transportam.

A principio custa naturalmente, a quem não está habituado, a sentir-se confortavelmente transportado pelo trabalho violento de humanas creaturas. Mas vem o habito, e com elle a apreciação do treno grande que essa gente tem, podendo correr durante horas sem grande esforço a velocidades moderadas, e aguentando facilmente uma corrida veloz, para menos importantes extensões; e acaba-se por achar natural, e até commodo e agradável, esse meio de transporte”

(1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

(2) MACHADO, Álvaro de Mello – Coisas de Macau. Livraria Ferreira, 1913, p. https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/alvaro-de-melo-machado/

(3) Em 1907 existiam sete automóveis e em 1911, apareceu o primeiro táxi.

(4) Também as entidades oficias tinham os seus jerinshás particulares, como se pode comprovar com esta informação: “13-04-1914 – Aquisição de quatro jerinxás, do tipo Saigão, para o Palácio do Governo (A.H.M.-F.A.C-. P. n.º 73-S-E) in SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Vol. III, 2015, p. 78.

Anteriores referências aos riquexós/ jerinxás em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

Como forma de regularizar o sistema de transporte – jerinxás/riquexós (1), (2) o governo, optou pela concessão em regime de monopólio mas surgiram nos últimos anos do século 19 várias greves. Para tentar revolver o problema, surgiu a hipótese de municipalizar este serviço, isto é, ficar o Leal Senado com o exclusivo dos serviços de transporte, mas não foi concretizado. (3)

Mas em 7 de Julho de 1909, nova greve de serviço de carros – «jerinxás» – promovida pelos cules. (4)

(1) O primeiro regulamento deste meio de transporte data de 1883, tendo sido alterado em 1888. Incluía questões relacionadas com a sinalização, estacionamento, circulação e preços do respectivo aluguer. Em 27-08-1883, após Sessão da Câmara, o Leal Senado de Macau apresenta ao Conselho da Província um projecto de Postura sobre a circulação, vigilância e preços dos carros chamados «Jin-rik-shás» (riquexós); o projecto é aprovado em 26-09-1883 e publicado integralmente no Boletim N.º 42 de 20 de Outubro.

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Extraído de «BPMT», XXIX-42 de 20 de Outubro de 1883, pp. 370-371

(2) O Jerinxá ou riquexó é um pequeno carrinho, muito leve, de rodas raiadas de arame de aço e guarnecidas de arcos de borracha, com assento para uma pessoa. Possui capota para o sol ou para a chuva, dois delicados varais entre os quais se coloca o cule a puxar; e como se tratasse de qualquer outra carruagem, tinha uma campainha ou guizo e as respectivas lanternas. O jerinxá teve origem no Japão jin-riki-gá (homem-força-carro) os ingleses adoptaram o termo para jin-riki-shá e simplificaram depois para rick-shaw. A grafia “riquexó” terá surgido, pela primeira vez, num texto do escritor macanese contemporâneo Luís Gonzaga Gomes” (informação de CAVALHEIRO, Jorge in “Da Sampana ao Jactoplanador, Da Cadeirinha ao Automóvel”, pp. 42-44)

jin-riki-gá, Japão, c. 1897 (https://en.wikipedia.org/wiki/Rickshaw)

(3) Há uma notícia surgida no semanário luso-chinez «Echo Macaense» (1893-1898) de 3 de Janeiro de 1895 que refere “Estão em greve os conductores dos carros jinrickshas [riquexós]. É a segunda vez que isto acontece. Já estava previsto que o regime de monopolio traria por repetidas vezes estas semsaborias. O monopolista não pode explorar o público, porque não pode alterar a tabella dos preços, visto que se obrigou por contrato a respeitá-la. Resta-lhe portanto explorar o trabalho insano dos pobres conductores…”

(4) SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Volume III, 2015, p. 38

Ver anteriores referências em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

Continuação da reportagem já postada no ano passado – 2019 (1) de Adam M´Cay publicada no jornal “The Sun”.

«The Sun, Vol. VI, Issue 1774, 21 October 1919», p. 6.

(1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2019/10/21/noticia-de-21-de-outubro-de-1919-imperial-portugal-colony-of-macao-i/

O último postal da colecção “A Harmonia das Diferenças” – fotografias do princípio aos meados do século XX (1902 -1950) – publicados pelo Instituto Cultural do Governo da R. A. E. M / Arquivo Histórico de Macau, em 2015. (1)

De 1950, um retrato dos homens dos riquexós, (2) em tempos de chuva, “estacionados” no Largo do Senado, aguardando os clientes.

Homens dos riquexós em tempos da chuva c. 1950
Verso do postal

O meio de transporte mais popular e mais barato, em Macau, até finais da década de 40 (seculo XX) era o riquexó ou jinrixá (2). Em 1950 estavam ainda registados na cidade de Macau, 25 empresas ou locadores deste tipo de veículos, embora cada vez em menor número. Assim como exemplo o número de licenças passadas pelo Leal Senado de Macau para jinrixás de aluguer, no ano de 1948, decaíram ao longo do ano: 1.º trimestre (1106), 2.º trimestre (948), 3.º trimestre (955) e 4.º trimestre (873) e para jinrixás particulares ao longo do ano, somente 13 licenças. (Anuário de Macau, 1950)

LARGO DO SENADO c. 1940

No Largo do Senado, os riquexós de aluguer estacionados. Vê-se ainda dois automóveis ligeiros que em finais da década de 30, em Macau, já eram cerca de 200.

(1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/category/postais/

(2) Anteriores referências aos riquexós/ jinrixás https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

Continuação da leitura de Francisco de Carvalho e Rego, publicado em anterior post (1):

As três curvas da Baía da Praia Grande (final da década de 40, século XX)

“… Então, o cunho português desaparecia, surgindo o aspecto de um a pequena cidade chinesa, que a avenida marginal do Porto Interior revelava aos olhos cobiçosos do observador.
O peixe estendido pela via pública, exposto ao Sol, na salga que o chinês faz a capricho, espalhava pelo ar um aroma desagradabilíssimo que, de mistura com o cheiro de hortaliças salgadas, do balichão e outros produtos da indústria explorada, confundia e perturbava quem a ele não estivesse acostumado.
Altos rickshaws, pintados a vermelho, com aros de ferro nas rodas, cruzavam a rua em correria, sem que os peões se afastassem, apesar dos altos gritos dos cúlis.
O casario baixo e sujo igual em toda a Avenida marginal, sendo os baixos utilizados para comércio e o primeiro e único andar para moradia.
Junto ao cais de desembarque viam-se muitos rickshaws, e cúlis segurando longos e grossos bambus, prontos para a descarga.
Serviço da polícia marítima, rudimentaríssimo, era feito nos cais por um ou outro indiano, auxiliado pelos chamados loucanes, que vestiam uniforme curiosíssimo, com meias brancas por fora das calças e pequenos chapéus feitos de filamento de bambu.
O policiamento das ruas pertencia aos soldados de infantaria que, de grandes chapéus de aba larga, se lobrigavam de quando em vez, aqui, ali, ou acolá.
Desse cais do porto interior caminhava-se para o coração do bairro chinês e, por ruas tortuosas, vinha dar-se ao Largo do Senado, onde o edifício da Câmara mais e melhor nos fazia lembrar que tínhamos deixado a China e regressado a Portugal.
Só faltava o pelourinho!”…”

continua

Balichão – tempero para guisados ou acepipes; molho composto de camarões pequenos, esmagados com sal, pimenta, malagueta, aguardente e aromatização com folha de louro (2)
Cúlis do inglês coolie – Cule- trabalhador chinês: carregador (carregava aos ombros  os palanquins, liteiras)  estivador, puxador de carroças e riquexó, condutor de triciclo, etc (2) Ver:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/cules/
Loucanes – assim denominados os “marujos chineses”.
Riquexó, “rickshaw” ou jerinchá – é o meio de transporte humano em que uma pessoa puxa por uma carroça de duas rodas. Ver:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/
(1) REGO, Francisco de Carvalho e – Macau … há quarenta anos in «Macau». Imprensa Nacional, 1950, 112 p.
(2) (BATALHA, Graciete – Glossário do Dialecto Macaense, 1988 e Suplemento ao Glossário do dialecto Macaense, 1988.

Não obstante o aparecimento dos ónibus, com carreiras regulares, ter resolvido em grande parte o problema dos transportes, continuavam os automóveis que faziam serviço na praça a exigir, com sucesso, tarefas exageradíssimas. (1)
Em face disso e havendo várias pessoas interessadas no serviço de automóveis com taxímetros, resolveu o Leal Senado igualmente abrir praça para a concessão do exclusivo desse serviço, tendo em sua sessão ordinária, de 10 de Março de 1948, feito a adjudicação a Companhia de Táxis “Oriente”, (2) pelo prazo de 2 anos. A escritura foi assinada em 30 desse mês e antes de findar o mês seguinte, já a nova Companhia punha 10 viaturas em serviço, número esse que em 1950, era de 14.

companhia-de-taxis-orienteUm automóvel de passageiros da Companhia de Táxis «Oriente», com uma inovação : taxímetro.

Este serviço teve o condão mágico de imediatamente fazer descer, para aproximadamente um terço, os preços pedidos pelos automóveis de praça. Não contentes com isso, os proprietários destes foram reduzindo os seus preços ao ponto de elas serem em 1950 inferiores à tarifa dos táxis o que causa grande prejuízo a estes, cerceando-lhes o seu desenvolvimento.
A seguir a relação dos veículos automóveis em circulação em Macau (excluídos as viaturas pertencentes aos Serviços Militares) nos anos 1946 a 1948.

1946 1947 1948
Automóveis ligeiros 125 163 282
Automóveis pesados 46 60 179
Motocicletas simples 16 12 29
Motocicletas com carro lateral 7 7 4
TOTAL 194 242 494

Dados retirados do Anuário de Macau, 1950.
(1) É de salientar que o meio de transporte naquela época, em Macau, mais popular e mais barato era ainda o riquexó ou jerinxá. (3) Em 1950 estavam registados na cidade de Macau, 25 empresas ou locadores deste tipo de veículos.
(2) A Companhia de táxis «Oriente» tinha a sua sede na Rua dos Mercadores n.ºs 108-110
(3) Ver anteriores referências em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/

Data de muitos  anos, em Macau, a existência destes modestos trabalhadores, figuras típicas deste Oriente sempre desconhecido, exótico e fértil em sensações.
Condutores de riquexós (1) – veículos para transporte de um passageiro – os cules (2)  simbolizam a velha e tradicional China, onde se trabalha indiferente à natureza  do serviço, ainda que este pela sua qualidade nos pareça vexatória de dignidade humana.
No  seu jeito característico e com uma passada de cadência matemática , palmilham diariamente  – na melhor hipótese de numerosos clientes – alguns bons quilómetros.

MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós ICondutores de riquexós aguardando os clientes

Tomando apenas ligeiras refeições de arroz ou massa com peixe ou carne, ou a tijela de canja, percebe-se que não são indivíduos dotados de muita força. Possuem, no entanto, uma resistência inconcebível na sua corrida de fraca velocidade, mas sempre igual, em contraste com a sua aparência franzina e débil.
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós IIDesconhecedor dos costumes e tradições do Oriente, qualquer europeu ou americano que desembarque em Macau, sente uma desagradável impressão pelo quadro desumano ao ver  um homem acarretar com outro, qual quadrúpede, num panorama idêntico à besta  que puxa a carroça em qualquer  terra da nossa metrópole. Não há dúvida, porém,  que são  mais carregadas as cores do cenário que a realidade  dos factos. Segundo eles próprios confessam, não é a força o elemento principal a considerar, pois as ruas onde, estes carros transitam são, na sua maioria, planas e cimentadas.
À partida, após o esforço inicial no arranque do carro, que possui as duas rodas forradas de borracha , a virtude dos condutores está em conseguir manter o carro em equilíbrio e toada certa , conservando sempre o impulso primitivo, o que conseguem colocando as mãos nos varais de modo especial.
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós IIIE depois, no género de trotar, ritmo compassado, sem grande esforço, exceptuando numa ou noutra rua um pouco íngreme, lá seguem, lestos, sem frouxidão, na ânsia de bem servir.
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós IVÀ falta de passageiro, utilizam o veículo para transporte de muitas e variadas coisas, causando, por vezes, profunda admiração, a quantidade de peças de mobiliário que acomodam num tão pequeno carro.
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós VOs cules, na sua maioria, não têm horário definido para tomar as suas parcas refeições. Comem a qualquer hora, a sua tijela de arroz ou massa, com um pouco de peixe ou carne, servindo-se de ordinário, dos cozinheiros ambulantes que abundam pelas ruas de Macau.

MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós VINo estacionamento, nas horas de ócio, conversam com grande alarido.

Como distracção, vão uma vez por outra ao cinema, ao jogo de bolinha (futebol em miniatura) e só com grande sacrifício assistem ao Auto-China, espectáculo demasiado dispendioso para as suas reduzidas possibilidades financeiras. Como, aliás,  quase todos os chineses, são singelos no seu trajar, e a sua indumentária, simples e prática, adequa-se bem à função que desempenham. Em pleno Verão, cálido, saturado de humidade, temperatura asfixiante, quase insuportável, usam apenas camisola, calção e alparcatas, trazendo alguns o característico chapéu largo «tudum», (3)  feito de fibras de bambu forradas de folhas de palmeira, para a chuva ou sol.
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós VIINos dias chuvosos, vestem um impermeável o «so-i», (4) feito apenas de folhas secas de palmeira.
Em 1951 foram introduzidos em Macau os triciclos que comportam dois passageiros, veículos menos bárbaros à vista do visitante, mas que obrigam os cules a um maior esforço na sua condução.” (5)
MBI I-3 15SET1953 Os cules dos riquexós VIIICom a introdução dos triciclos que chegaram a circular cerca de mil, o número de  riquexós diminuiu progressivamente até ao seu desaparecimento. Creio que na década de 60 já não existia nenhum riquexó para transporte de passageiros embora recorde de um ou outro ainda a circular, levando mercadorias. Os triciclos por sua vez, como transporte público permaneceram até a década de 70 e hoje (escassos) são só para o transporte de turistas.
(1) Riquexó, “rickshaw” ou jerinchá – 人力車 (mandarim: rén li che; cantonense jyutping: jan4 lik6 ce1) é o meio de transporte humana em que uma pessoa puxa por uma carroça de duas rodas. Os primeiros jirinkshás (riquexós) terão surgido em Macau em 1883.
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/riquexos/
(2) Cule era um trabalhador chinês, carregador, estivador, puxador de riquexó, condutor de triciclo, etc. Várias hipóteses para a origem deste termo, desde  meados do século XVII: do hindi/urdu «qulī» que significa “trabalhador(diário)”; do tribo natural do Guzerate «kulī», com o mesmo significado;  palavra tâmil «kuli», salários.
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/cules/
(3) Um dicionário online define tudum (substantivo, masculino) como um termo de Macau significando «capucha preta, usada por senhoras»
http://populu.net/tudum.
No entanto o correcto é a definição da professora Graciete Batalha: “chapéu feito de ola e coberto de tiras de bambu entrançado, usado pelos pescadores e trabalhadores chineses (homens e mulheres) para se protegerem quer do sol, quer da chuva”. O termo possivelmente no passado terá vindo do malaio «tudong», identificando-o com o “dó preto, bloco usado pelas damas macaenses ” (Glossário do Dialecto Macaense, 1977)
(4) 水衣 (mandarim pinyin: shuǐ yī; cantonense jyutping: seoi2 ji1 – água+cobertura/vestimenta
(5) Retirado de «Macau B. I.,1953»