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“17-09-1808 – Ofício do Mandarim de Casa Branca ao Procurador de Macau (1) dizendo que «embora o pequeno território de Macau tenha sido cedido aos portugueses por um acto de bondade e de piedade da Celeste Dinastia da China, e ainda que eles o ocupassem em paz e bom entendimento desde há centenas de anos, entretanto, só era permitido aos navios de guerra de reinos estrangeiros que vinham para Cantão, chegar até às imediações de «Kai Keang» (Ponta da Cabrita, Taipa) (2) não podendo positivamente entrar em Macau à sua vontade, nem residir ali sem infringir as normas em vigor, aliás observadas desde há muito como constava dos arquivos»”. (3)

(1) O Procurador do Senado de Macau em 1808 era Manuel Pereira.

(2) A 8 de Dezembro de 1989, o Governador Carlos Melancia provocou uma verdadeira explosão no território ao carregar no botão que fez deflagrar duas toneladas de explosivos para desmontar o morro da Ponta da Cabrita, assinalando assim o início formal das obras do aeroporto internacional de Macau. Ver anteriores referências em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/ponta-cabrita/

(3) SILVA, Beatriz Basto da – , Cronologia da História de Macau, Volume II, 2015, p. 15)

Descrição de Macau, de 1822, em inglês, com o título “Entrance to Canton from tha Sea” publicado no periódico “The Indo-Chinese Gleaner” (1) no Capítulo “I.Indo-Chinese Literature I.Annals of Canton“
(1) “The Indo-Chinese Gleaner”, n.º XX, April, 1822, pp.280-283.
https://digital.staatsbibliothek-berlin.de/werkansicht?PPN=PPN771550391&PHYSID=PHYS_0053&DMDID=DMDLOG_0001

A 8 de Dezembro de 1989, o Governador Carlos Melancia provocou uma verdadeira explosão no território ao carregar no botão que fez deflagrar duas toneladas de explosivos para desmontar o morro da Ponta da Cabrita, assinalando assim o início formal das obras do aeroporto internacional de Macau (1)
O acontecimento foi presenciado por muitos curiosos (eu assisti da Estrada de Cacilhas, a perda de parte de uma “paisagem” diária da minha infância e adolescência)
A inauguração do aeroporto oficial (2) foi a 8 de Dezembro de 1995 (seis anos depois deste acontecimento) embora os voos tenham iniciado a 9 de Novembro de 1995.
Pormenor de um Mapa de 1934 onde se assinala a localização da Ponta Cabrita na ilha da Taipa Grande
Actualmente , embora inexistente a Ponta da Cabrita, permanece na Toponímia da Ilha da Taipa nas proximidades do Aeroporto,  a Estrada da Ponta da Cabrita – 雞頸馬路
Um trecho da estrada para a Ponta da Cabrita de autor não identificado, (data:?) do espólio do  IICT/Cartografia; Centro de Documentação e Informação.(3)
(1) Extraído do “Baú de recordações” do JTM.
(2) https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/aeroporto-internacional-de-macau/
(3) https://actd.iict.pt/view/actd:AHUD5114

“Junto à embocadura do rio, existia uma povoação de pescadores que trocava o peixe, recolhido no alto mar, por arroz e legumes cultivados por agricultores que viviam para além dos muros da cidade, no local hoje conhecido por Bairro de Mong-Há.
Um dia, quando os pescadores andavam na faina, foi visto um grande cardume de peixe, nadando e saltitando em alta velocidade, em direcção às nove ilhas. Desde logo, os pescadores concluíram que qualquer coisa de anormal provocara aquele súbito movimento colectivo.
Minutos mais tarde, o céu cobriu-se de nuvens escuras e um forte vendaval veio colocar em perigo a maioria dos juncos de pesca, devido às gigantescas ondas que se formavam . Numa luta desesperada contra as forças da natureza, os pescadores tentaram chegar à Ponta da Cabrita, na ilha da Taipa, mas algumas embarcações foram de encontro aos enormes calhaus que havia naquelas bandas.

Pormenor Macau Taipa Ponta Cabrita 1934Pormenor de um Mapa de 1934 onde se assinala a localização da Ponta Cabrita
(arrasada para construção do aeroporto de Macau)

Quando o vendaval começou a abrandar, por entre as negras nuvens que cobriam o firmamento, os pescadores depararam-se coma  presença de um vulto sobre o mar, semelhante à imagem de uma mulher, que, de braços abertos e girando em tornos dos quatro pontos cardinais , parecia ordenar fim ao temporal.
De facto, assim aconteceu: de repente, o Sol tornou a brilhar sobre o azul do firmamento, como se nada tivesse acontecido, deixando os homens do mar boquiabertos.
De regresso a Macau, os pescadores ancoraram na Praia do Manduco e imediatamente foram agradecer à deusa A-Má, a quem atribuíram ele bondoso milagre que lhes poupara a vida, acendendo pivetes e oferecendo bons acepipes, como manda a tradição.

Pormenor Mapa Macau Siac 1929Pormenor de um Mapa da Colónia de Macau, de 1929
Sinalizada a zona de Macau Siac, já com os aterros efectuados.

Nessa mesma tarde, os pescadores reuniram-se numa residência, a fim de trocarem impressões sobre o acontecimento, tendo a maioria concluído que tinham tido a mesma visão.
A partir de então, resolveram destinar parte do lucro da venda do pescado para a construção de um novo templo (Macau-Siac) que foi, entretanto, erguido no topo de um pequeno outeiro existente nas proximidades do reservatório de água.
BARROS, Leonel – Tradições Populares, Macau. Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM), 2004.
Sobre o Templo de Ma Kau Seak /Macau-Siac, e a Ponta de Cabrita, ver:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/07/15/o-pagode-de-macau-seac-jaime-do-inso-1929/
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/ponta-cabrita/

Mapa que muitos ainda se recordarão, pendurado  no “quadro preto” ou na parede da Escola Primária (na sala da 4.ª classe).

Mapa de Portugal Insular e Imperio Colonial Português - 1934MAPA DE PORTUGAL INSULAR E IMPÉRIO COLONIAL PORTUGUÊS

Este mapa é de 1934; edição da LIVRARIA ESCOLAR “PROGREDIOR”  (Rua Passos Manuel – Porto); coordenado por Manuel Pinto de Sousa.

Mapa de Macau 1934Assinalados na cidade de Macau:  os Fortes de D. Maria II, da Guia, de S. Francisco, de S. Tiago da Barra; as  Portas do Cerco, a Ilha Verde já com istmo de ligação à cidade, a Baía da Praia, e Macau Siac.
Na Taipa: o Forte da Taipa, a Ponta Cabrita e  a Ponta Maria.
Em Coloane: o Forte Coloane, a Ponta de Cahó (Ka Hó) , a Baía de Hac-Sá, as povoações de Cahó (Ka Hó),  de Lai Chi Van, de Coloane, de Hac Sá e de Tai Van;
e as pequenas ilhas : da Pedra, de Kai Kiong e a Pedra da Areca.

“Foi também devido à insipiente crença do fông-sôi (1) que, por largo tempo, se não atreveram os chineses a residir no sítio que é hoje a Avenida República, preferindo os próprios pescadores construir as suas barracas na Barra, pois diziam que a prosperidade do mencionado local estava ameaçada por um suposto bico de galinha (kâi-tchôi) (2) constituído pela extremidade da pequena ponta de terra da fronteira ilha da Taipa que, por ser algo prolongada e apresentar uma protuberância no seu rugosos relevo, faz lembrar o colo distendido dum galináceo de ingurgitada inglúvia, (3) sendo, por isso, conhecida entre os chineses pelo nome de Kâi-Kéang (Pescoço de Galinha) (4).

Sob o Olhar de A-MÁ - Av Repblica c. 1950Vista panorâmica da Avenida da República c. 1950

 Se tal bico de galinha estivesse revirado para outra banda, bem estava. Infelizmente, não era isso o que acontecia. O obnóxio (5) bico estava ominosamente assestado em direcção da Avenida da República, ameaçando reduzir até à extrema inópsia (6) o indivíduo que ousasse residir em tal sítio, pois quaisquer riquezas que este possuísse seriam, inexoravelmente debicadas, aos poucos.

macaostreets - Av. República c. 1935Vista panorâmica da Avenida da República c. 1935 (7)

 Então, para eliminar a sua nocividade, colocaram, no sopé da colina da Penha e mesmo em frente da Ponta Cabrita (Taipa) uma estatueta em pedra da Móng-Hói Kun-Iâm (Deusa da Misericórdia que mira o mar) (8) na esperança de impedir, com o seu manto, quaisquer malignas influências daquele nefasto bico de galinha. Porém, como a Kun-Iâm não tinha suficientes poderes para tornar inóxio o amaldiçoado bico, descobriram, então que a parte da colina que fica voltada para a Taipa se parecia com a cabeça de leão e, com o fim de lhe darem vida, para esta fera devorar, com a sua bocarra, todos os fluxos obnóxidos emitidos pelo bico da alinha, instalaram duas brilhantes luzes em duas covas da vertente que correspondiam, mais ou menos, às suas órbitas.
Dizem que foi, desde então, que o sítio da Avenida da Republica se tornou habitável.” (9)

(1) Geomancia chinesa 風水mandarim pinyin: fēng, shuǐ ; cantonense jyutping:  fung1 seoi2
(2) 雞嘴mandarim pinyin: jī zui; cantonense jyutping:  gai1 zeoi2
(3) inglúvio – papo ou primeiro estômago das aves.
(4) mandarim pinyin:  jī  gěng; cantonense jyutping:  gai1 geng2
(5) obnóxio – perigoso, nefasto, desprezível, funesto
(6) inópsia – penúria, miséria
(7)  https://macaostreets.iacm.gov.mo/p/parishoface2/photoalbum.aspx?album=%E6%B0%91%E5%9C%8B%E5%A4%A7%E9%A6%AC%E8%B7%AF
(8) 望海觀音mandarim pinyin: wàng hǎi guān yīn; cantonense jyutping:  mong6 hoi2 gun1 jam1
(9) GOMES, Luís Gonzaga – Macau Factos e Lendas. Edição da Quinzena de Macau, 1979, p. 152.