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Do diário de Harriet Low, para este dia de 2 de Abril de 1830:

George Chinnery – Forte de São Francisco com o Fortim de S. Jerónimo em 2.º plano e ao longe, o Forte da Guia, 1833

«Depois do jantar, olhando pela janela, vi um dos barcos da Companhia (East Ìndia Company) com o sol brilhando sobre as suas bem enfunadas velas. Como desejei possuir o talento para a pintura de sr. Chinnery, (1) a fim de poder esboçar para ti a linda vista que tinha diante de mim, a grande e elegante igreja, branca de leite, com uma esplêndida escadaria de pedra e cercada de árvores e arbustos (Igreja do Convento de S. Francisco). (2)

George Chinnery – Degraus da Igreja de S. Francisco , c. 1835-38
George Chinnery  – Mosteiro/ Convento e Fortaleza de S. Francisco, c. 1833-38

Pouco além, a fortaleza (de S. Francisco), (3) e a baía alongando-se. Ainda mais além, podem-se ver os barquinhos, resvalando-se sobre a superfície das águas do rio. À distância, podem-se discernir duas elevadas ilhas e um lindo barco, desmandando a sua tal alvejada pátria. Um porco mais longe está um pequeno barco europeu, navegando a toda a vela e, à vista, uma quantidade de barcos chineses. Pode agora imaginar quão agradável á a vista que gozamos do nosso terraço? (4)

E agora estou aqui sentada no meu quarto a lutar contra os mosquitos. A cada meio segundo, ponho a pena na boca, enquanto me esforço por cometer assassinatos. Os cúlis estão a “dormir bem audivelmente” debaixo do meu quarto. Não conheço ninguém que ressone tão fortemente como eles. A tia Low tem mandado lá abaixo alguém, muitas vezes, às tardes a virá-los” (5) (6)

George Chinnery – Mosteiro de S. Francisco e Fortaleza d Guia ao longe, c. 1835-38

(1) George Chinnery, pintor inglês, nascido a 05.01-1774 e falecido em 30-05-1852. Ver anteriores referências em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/george-chinnery/

(2) A igreja com a sua elegante escadaria de pedra e o convento foram demolidos em 1864. Na mesma data foi completamente destruída a fortaleza e levantada outra, de que sé resta o muro exterior. No lugar do convento surgiu o quartel que foi concluído em 1866. Quatro colunas salomónicas e o altar do Crucifixo foram parar à Igreja do Seminário de S. José, onde ainda hoje se podem admirar. (6)

TA-SSI-YANG-KUO, Volumes I e II, 1899

(3) “… dali (da Fortaleza da Guia) volta o muro para o sul em direitura ao convento de S. Francisco, e antes de chegar a ele tem hua porta que cahe para o mar , a qual se fecha todas as noites. Está a Fortaleza de S. Francisco pegada ao convento, que te hu postigo na cerca dos Frades, e da parte de dentro a porta da Fortaleza tem hua peça de 40 libras de bronze invocada N. Snra. De Loreto, outra peça de 20 libras de bronze invocada N. Snra. do Rozario , segue-se outra peça de 18 libras de bronze, e vindo correndo o pano de muro para a p.te da Cidade, e praya grande que acaba no princípio da Povoação da Cid.e, aonde tem hua porta que sahe para o rocio (7) de S. Francisco” ( Padre José Montanha – Apparatos para a Historia de Macau”) (6) (8)

(4) Terraço da casa do tio da Harriett, sr. William Henry Low, que foi o chefe da firma Russel & Co. (desde 1 de Janeiro de 1830 até Outono de 1833, quando partiu de Macau, por causa da doença respiratória), ficava no Pátio da Sé, n.º 2, ao alto da Calçada de S. João.

(5) TEIXEIRA, Padre Manuel – Toponímia de Macau, Volume II, p. 10

(6) TEIXEIRA, Padre Manuel – Macau do Séc. XIX visto por uma jovem americana, 1981, p.6

(7) Rocio , aliás rossio é uma praça ou terreno espaçoso e refere-se ao Campo, hoje Jardim de S. Francisco..

(8) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2021/03/14/noticia-de-14-de-marco-de-1761-a-livraria-do-colegio-de-s-paulo-e-os-caixotes-do-irmao-jesuita-joao-alvares/

Outros enxertos do diário de Harriet Low, neste blogue, em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/harriet-low/

Foi em 2 de Setembro de 1913, designada pelo nome de «Avenida Almeida Ribeiro» (1) a nova Avenida do Bazar (2). De facto, a Avenida foi feita e aberta por partes. O último troço, a ligação da já designada Av.  Almeida Ribeiro à Praia Grande, só teve o projecto aprovado em 16-10-1918, pelo Conselho Técnico das Obras Públicas,  pelo que só posteriormente é que foi construída e concluída, em 1919 (?) (3) (4)

POSTAL 1986 Av. Almeida RibeiroPOSTAL –  AVENIDA ALMEIDA RIBEIRO – 1986
Copyright Dept. of Tourism (D. S. T.) MACAU – 5000 – 86 – 12
Impresso na Gráfica de Macau Lda.

NOTA: Já em 1905 J. Dyer Ball (“Macao: the Holy City,  the Gem of the Orient Earth”) (5)  referia ao projecto da construção desta “avenida”
Of late years Macao after a period of stagnation has been much improved by new roads laid out over the Campo and about the hills. A grand new avenue to cost $ 300,000 and to lead in direct line from the Inner Harbour opposite the Steamboat Company’s wharf to the Praya Grande, was mooted some years since; but the money has been spent on other improvements.

POSTAL 1986 Av. Almeida Ribeiro by nightPOSTAL –  AVENIDA ALMEIDA RIBEIRO BY NIGHT- 1986
Copyright Dept. of Tourism (D. S. T.) MACAU – 5000 – 86 – 12
Impresso na Gráfica de Macau Lda.

(1) “Porque tem esse nome? Pura e simplesmente porque esse homem (Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro), quando ministro das colónias (1913-1914) sancionou a verba para a expropriação  das casas para a abertura da avenida. Apenas isto: uma penada autorizando uma verba  (TEIXEIRA, P. Manuel – Toponímia de Macau, Vol. II, 1997).
(2) Arquivo Histórico de MacauF. A. C. P. n.º 329 – S-N.
O Padre Teixeira dá a inauguração em 1915 na parte a poente do Largo do Senado. Nesse mesmo ano, a 7 de Abril de 1915, já havia um projecto de iluminação eléctrica para a Avenida.
(3) SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Vol. 4, 1997.
(4) “1918 – Mais um troço da Avenida de Almeida Ribeiro rasgado. Para tanto, foi demolido um pavilhão que existia em frente ao Leal Senado e a casa do rico comerciante Lin Lian, então situada no cruzamento da Av. de Almeida Ribeiro com a Rua da Praia Grande. (GOMES, Luís G. – Efemérides da História de Macau, 1954.)
23-01-1919 – Aprovado por P.P.18, desta data, o projecto de expropriação para conclusão da Av. Almeida Ribeiro e a sua ligação com a Praia Grande (77 360 patacas; P.P. 82). Expropriação de vários prédios do Largo de Senado, Travessa do Roquete, Rua da Sé e Pátio da Sé, zona sensível, cenário dos primeiros tempos de Macau” (Arquivo Histórico de Macau F. A. C. P. n.º 172 – S-E).
(5) http://www.archive.org/stream/macaoholycitygem00ballrich/macaoholycitygem00ballrich_djvu.txt
Referências anteriores desta Avenida:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/avenida-almeida-ribeiro/

Outra descrição de tufão que passou por Macau – 23 e 24 de Setembro de 1831.
Harriet Low (1) descreve no seu diário, o tufão que desabou sobre a cidade:
“Destruiu completamente a Praia Grande; arrancou pedaços de granito de dez pés, projectando-os contra os vestíbulos das casas…
Nada mais que uma cena de destruição esta manhã!
A nossa varanda (2) está bastante destelhada, as nossas esteiras desapareceram todas.
Onde está o cais? Foi-se; ficou completamente demolido! O telhado da Casa da Companhia abateu e imensas massas de granito foram projectadas no solo.
Muitas casas chinesas no extremo do cais foram arrancadas e a ermida da Penha encontra-se muito danificada.
Na avenida está a quilha de um grande barco, que ainda há poucos dias eu vi entrar com as velas pandas nos seus altos mastros e que agora estão niveladas sem a quilha, não ficando um único pau de pé”

Vista da Praia Grande c. 1830 (3) 

(1) Harriet Low viveu cinco anos (1829 -1835) em Macau (natural de Salem, Estado de Massachusetts). Chegou a Macau a bordo do navio “Sumatra“, sob o comando do Capitão Roundy, em Setembro de 1829

Harriet Low 1833, George Chinnery (4)

(2) Harriet Low estava hospedada na residência do seu tio W. H. Low, que era então chefe da firma americana Russel & Co. Esta casa ficava no alto da Calçada de S. João, no prédio n.º 22 do Pátio da Sé (também mencionada por Largo da Sé) sendo a primeira à direita, ao descer essa Calçada . Samuel Russel veio para a China em 1818 como representante dos interesses de Hoppin Brothers, de Providence, R. I. que se associou, em 1824,  à firma de Thomas H. Perkins, resultando “Russel & Co.” Em 1846, passou a firma a estabelecer-se em Hong Kong. Foi uma das mais influentes no Extremo Oriente até 1891.
TEIXEIRA, M – Macau através dos séculos. Macau, Imprensa Nacional, 1977, 87 p.
(3) Retirado de “Rise & Fall of the Canton Trade – Image Galleries – Places”
http://ocw.mit.edu/ans7870/21f/21f.027/rise_fall_canton_04/cw_gal_01_thumb.html
(4) Retirado de Rise & Fall of the Canton Trade System Gallery: PEOPLE
http://ocw.mit.edu/ans7870/21f/21f.027/rise_fall_canton_04/cw_gal_02_thumb.html

A propósito desta pintura , no seu diário, de 18 de Agosto de 1830,  Harriet Low  posou para o pintor Chinnery vestida com a última moda trazida de Calcutá – “com mangas enchidas com almofadas de penugem” e comenta:
               Such sleeves I never beheld—complete frights!”