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O Carnaval em Macau no ano de 1935, na descrição de Henrique de Senna Fernandes (1)
“O Carnaval de 1935 foi animadíssimo e, segundo os coevos, tão divertido e brilhante como o do ano transacto. Houve vários “assaltos” em casas particulares, mas o que excedeu toda a expectativa foi o que se realizou em 16 de Fevereiro, na Sociedade da União Recreativa. Ouçamos o “A Voz de Macau”, de 18, Segunda-Feira:
Realizou-se no Sábado, 16 do corrente, nos salões da U. R., um dos característicos “assaltos” carnavalescos que decorreu com uma animação desusada, tendo uma assistência computada em 200 pessoas.
São de louvar estas festas numa quadra em que a crise económica deprime a alegria salutar da mocidade.
Felicitamos os promotores desta simpática festa, srs. Edmundo de Senna Fernandes; Dr. Adelino Barbosa da Conceição, José Choi Anok, Alberto Barros Pereira e José Tavares.
A tuna do grupo deu uma animação extraordinária à festa e a sua entrada nas salas da S. U. R., acompanhada dum grupo de mais de 60 mascarados, foi verdadeiramente triunfal.
Que estas festas se repitam a fim de quebrar a monotonia em que vivemos.
O Carnaval propriamente dito iniciou-se no Sábado-Gordo, 2 de Março, com o baile local a rigor no Clube de Macau, tão protocolar e chique que alguém, fugindo para outro mais popular, o Clube de Sargentos (Sociedade Recreativa 1° de Junho), apelidou de “baile de embaixada”. E até Terça-Feira seguinte foi um delírio. Nesse ano, para animar os clubes havia um enorme grupo de Hong-Kong e mais a oficialidade da canhoneira inglesa “Moth” e da americana “Izabel”, que se aproveitaram da visita ao nosso porto para gozarem o Carnaval de Macau, que tinha fama nestas paragens.
Sobre o baile de Terça-Feira do Clube de Macau, extraímos o seguinte artigo do mencionado periódico:
Para não fugir à tradição, a festa da Terça-Feira do Carnaval, no Clube de Macau, foi de todas a mais animada. Foi interessante a entrada dum grande grupo de simpáticas meninas trajando diversos costumes regionais das Províncias de Portugal. Dispostas estas meninas numa roda, surgiu, como por encanto, uma interessante cigana que exibiu uma dança fartamente aplaudida pela numerosa assistência.
Tivemos a seguir uma desilusão quando descobrimos que a linda cigana era o Eduardo Silva!
Por volta das onze horas e meia fez a sua entrada na sala a ‘Tuna Camélia’, acompanhada dum luzidio cortejo de mascarados. A festa atingiu então a sua maior animação, tendo durado até altas horas da madrugada.
E assim terminou um Carnaval excepcionalmente animado”.
FERNANDES, Henrique de Senna – Cinema em Macau, III (1932-36)– RC.n.º 23, 1995

A Escola Chinesa «KUNG KAO HOC HAU», também conhecida pelos chineses como a mansão do Choi Lok Chi, nome em chinês de Joel José Choi (Anok) (1) foi mandada construir, em 1916 por um grupo de católicos (entre eles, Joel José Choi) para servir de escola católica e o prédio situa-se na Calçada da Igreja de S. Lázaro, n.º7. (2)

FOTO DE 1927 – ESCOLA CHINESA «KUNG KAO HOC HAU»

No “Anuário de Macau de 1927” refere a «Escola Kung Kao (Cong Cao)» (3) como de ensino em língua chinesa e inglesa e nesse ano tinha um total de 400 alunos e 5 professores.
No «Anuário de 1938», a escola «Kung Kao» estava indicada na Rua Nova de S Lázaro, n.º 1 com 94 alunos e no «Anuário de 1934» – «Kong Káo» na Rua Nova de S. Lázaro, 102  alunos.

FOTO DE 1927 – ESCOLA CHINESA «KUNG KAO HOC HAU» (1.ª CLASSE)

A 22 de Julho de 1916, foi lançada a primeira pedra para a construção duma escola chamada Kung Kao (religião Católica), deveu-se à iniciativa de José Choi Anok, Chan Chee, Francisco Tse Yat, Filip Tam, Francisco Xavier dos Remédios, Paulo Hui e Padre Jacob Lau.
As obras arrastaram-se por falta d dinheiro e o edifício só foi inaugurado a 27 de Maio de 1923; a escola só começou a funcionar a 1 de Setembro desse ano com 100 alunos.
O corpo docente compunha-se de dois professores de português – Com Jacob Lau e Padre Júlio César da Rosa e dois professores de chinês – Lei Yau Sam e Liu Fai Mang. (4)
O governador Rodrigo José Rodrigues, por Portaria n.º 108, de 4-06-1923, diz que, tendo assistido à inauguração do edifício da escola Primária Luso-Chinesa Kung Kao Hok Hao, que um grupo de cidadãos, por seu único esforço, dedicação e contribuição conseguiu erigir, “louvava em primeiro lugar Joel José Choi (Anok)) e ainda todos os cidadãos portugueses e chineses que concorreram para a edificação dessa escola.
Por proposta n.º 35,de Junho de 1924, foi concedido a esta escola a partir de 1-07-1924 um subsídio anual de 1.296$00 para manter uma aula de ensino de língua portuguesa.
O Dr. Nascimento Leitão dizia em 1923:
Hong Cao: – Rua do Monte, 4 – Tem 103 alunos, 11 dos quais do sexo feminino.
As retretes consistem em 5 celhas de madeira, destapadas, sob o respectivo palanque a transbordar de fezes, retardadas. Já há meses pedi que substituíssem aquelas retretes por 5 de caixa, visto não terem água, tendo também recomendado o uso de óleo mineral pesado nos urinóis.
Visitando agora 2.ª e 3.ª vezes, verifiquei que as retretes continuam no mesmo estado. Dei o prazo de oito dias para a sua substituição”
Em 1942 fechou-se esta escola devido à crise da II guerra mundial.” (4)
(1) Joel José Choi Anok – 崔諾枝 (5) (1867- 1945) – Nanhai, província de Guangdong (agora distrito de Nanhai, cidade de Foshan). Filantropo quando se reformou dedicou-se em exclusivo a obras sociais. Foi vogal do Leal Senado, vogal do Conselho do Governo, vogal da Santa Casa da Misericórdia de Macau, presidente da Associação de Beneficência «Tong Sing Tong» (de 1939 até morrer), presidente da Associação Católica Chinesa, e antes da guerra do Pacífico, vice-presidente por mais de dez anos e presidente (por duas vezes) da Associação Comercial/ Câmara Geral de Comércio Chinesa de Macau (depois chamada Associação Comercial de Macau – alvará de 1912). Foi vice-presidente de 1927 a 1940 e presidente da Associação de Beneficência do Hospital Kiang Wu.
Foi agraciado com o grau de Cavaleiro da Ordem de Cristo e várias distinções da Cruz Vermelha Portuguesa.(6)
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/joel-jose-choi-anok/
NOTA: Joel José Choi, pai de Roque Choi (Roque Choi 崔乐其 (Cui Leqi) (7) tinha também uma casa principal na Calçada do Gaio, n.º20 que o seu filho Roque Choi herdaria após ter adquirido a quota da irmã. Esta casa manteve-se depois durante muitos anos desabitada e depois em ruínas e é nessas condições que me lembro, pois passava por esta rua frequentemente vindo e indo da minha casa, na Estrada de Cacilhas. Diziam as más-línguas que a casa estava assombrada. Esta casa e o seu terreno foi vendida em 2004 para se construir um prédio mas foi embargada, por ter a sua altura ter ultrapassado a quota de protecção da vista do farol da guia. Creio que continua a obra parada.
(2) Calçada da Igreja de S. Lázaro começa na Rua de Volong, em frente da Rua de João de Almeida e termina na Estrada do Repouso, próximo do cruzamento desta estrada com a Rua de Tomás Vieira. Tem uma escadaria de pedra junto da Rua de Sanches de Miranda.
(3) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2018/06/04/leitura-macau-terra-da-doce-saudade-i/
(4) TEIXEIRA, Padre Manuel – A Educação em Macau, 1982
(5) Joel José Choi Anok 崔諾枝mandarim pīnyīn: cuī nuò qí; cantonense jyutping: ceoi1 nok6 kei4
(6) Referências retiradas de JORGE, Cecília; COELHO, Rogério Beltrão – Roque Choi, um Homem dois sistemas Apontamentos para uma Biografia. Livros do Oriente, 2015, 221 p.
Ver recensão deste livro por Moisés Silva Fernandes em:
Análise Social, 222, lii (1.º), 2017 ; issn online 2182-2999
http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/AS_222_rec06.pdf
Ver anterior referência neste blogue:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/joel-jose-choi-anok/
e em “UMA PASSEATA PELAS RUAS DE MACAU – TRAÇOS DE COMERCIANTES CHINESES FAMOSOS EM MACAU”
https://macaostreets.iam.gov.mo/showFile.ashx?p=macaustreets/doclib/635749087646668.pdf
(7) Roque Choi 崔乐其mandarim pīnyīn: cuī lè qí; cantonense jyutping: ceoi1 iok6 gei1

Dum livro escolar, editado pelos Serviços de Publicações do Comissariado Provincial da Mocidade Portuguesa de Angola, de 1972 (1), retiro este artigo referente a uma personalidade macaense que poucos conhecem e que merece a sua divulgação.

“ Uma firme e serena fisionomia, um comportamento exemplar e simpático, uma modesta e prestável gentileza – eis as marcas que julgam de engrandecer-lhe todos quantos ainda o conheceram.
Macau inteiro ainda recorda na convivência das pessoas e das coisas da governação, na defesa dos interesses da camada simples do povo, donde nascera. Homem curioso e culto, foram mesmo a sua elegância e simplicidade de maneiras que constituíra, na sua curiosa carreira, o valioso suporte de toda a sua acção.
Nós...Somos Nós - José Anock
Nasceu de pais chineses, na paróquia de St.º da velha cidade, em 1 de Fevereiro de 1867. Ainda soavam nítidos os ecos da vibrante ousadia de Nicolau de Mesquita ante as injustas pretensões de vizinhos dos meados do século.
Choi Anock teve a sorte de receber dos pais e dos missionários de sua comunidade uma boa iniciação cristã. Depois de seus primeiros estudos, em que não lhe foi difícil aprender a língua do seu País, alistou-se, de rapaz, no serviço da marinha. Criado de bordo, primeiro em navios portugueses que escalavam o porto de Macau, empregou-se depois como despenseiro numa canhoneira da nossa Marinha de Guerra. Todos o conheciam e consideravam pela sua arte de culinária, pela sua obediência e zelo de ofício. Todos: oficiais e camaradas, chineses e portugueses.
Coisa curiosa! Certos amores o foram prender, nas suas idas e vindas à capital do Reino, a uma senhora de Lisboa, de quem teve dois filhos.
Mas Choi Anock, que continuou ao serviço do Estado, voltou depois à sua terra oriental, constituiu família legal, educou e formou os seus filhos no mais genuíno amor nacional, no mais estrito acatamento das leis cristãs e portuguesas.
Vários governadores, dentre os quais salienta o macaense Artur Barbosa, julgaram-no indispensável no palácio. Precisando dos seus serviços, nomearam-no fiel o do Palácio, onde «a sua presença – como lemos em registo biográfico do «Noticias de Macau» – se notava pelo seu porte, pela disciplina que impunha a todos os seus serventuários, pela forma como dirigia um banquete, desde o arranjo da mesa até ao serviço dos criados, que o estimavam e cumpriam todas as suas indicações».
No seu despacho, no seu esmero, nas providências que tomava para chás, banquetes, recepções, de dia ou da noite, descansavam as senhoras do palácio. O fiel Choi Anock ganhou de todos, grandes e pequenos, o mais distinto e justo conceito.
Vivia já a sua meia idade quando, sentindo-se com aptidões superiores às de simples fiel, pediu que o dispensassem para se dedicar ao comércio particular. E sorrindo-lhe a sorte dos seus negócios, não se fechou egoisticamente no gozo dos seus bens. Bondoso e acessível, nunca ninguém da mais modesta condição dele se retirou sem o óbolo preciso.
Sincero na sua fé, Choi Anock activou a administração e direcção de diversas organizações católicas, cívicas ou humanitárias. Eis porque algumas delas guardam, em lugar de honra, o seu retrato, eis porque se orgulham de ter-lhe confiado a presidência de Beneficência «Tong Sing Tong», a Associação Católica Chinesa, a Associação de Beneficência do Hospital «Keang Wu», as confrarias de S. Vicente e de S. Lázaro.
A geral aceitação e competência deste homem simples do povo foi coroada quando enfim, o Governo de Macau o escolheu como representante da Comunidade Chinesa, para vogal do Conselho do Governo… (…)
Gasto, enfim, por uma vida trabalhosa, sem que jamais perdesse a serenidade e firmeza que lhe timbrou o ser, uma doença grave o vitimou para sempre, em 22 de Agosto de 1945. Tinha 78 anos.” (1)
(1)   Texto não assinado in SIMÕES, Antero – Nós … Somos Nós (“Antologia Portugalidade”), III Tomo. Edição dos Serviços de Publicações do Comissariado Provincial M. P., Luanda, 1972, 498 p.

NOTA POSTERIOR: este texto contém erros e  merece correcções:
1 –  A figura biografada é JOEL JOSÉ CHOI ANOK  e não  «José Choi  “Anock“»;  este é o nome do primeiro filho, que teve da governanta do ex-governador Custódio Miguel Borja que o levou para a Marinha em Portugal, filho nem sequer reconhecido imediatamente, dado que foi baptizado como filho de pai incógnito.
2 – Joel José Choi Anok nasceu a 17-03-1867 e não a 1-02-1867.
3  – Da “senhora de Lisboa” teve só um filho,  José Choi Anok.
3 – Creio que não chegou a ser Presidente da Associação Católica Chinesa; foi só conselheiro.
4- Não havia  “as confrarias de S. Vicente e de S. Lázaro” mas sim Confraria ou Sociedade de S. Vicente de Paulo da freguesia de S. Lázaro.
Quanto às sete condecorações que se vêem na foto, tirando a de Cavaleiro da Ordem de Cristo, as outras medalhas devem ser devido a distinções pela ficha exemplar na Marinha e pelos serviços prestados à Cruz Vermelha.
Agradeço a RBC as informações inseridas nesta nota.