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No Quartel das Portas do Cerco existia uma lápide de bronze com esta inscrição:

BATALHÃO DE CAÇADORES N.º 1
2.ª COMPANHIA
SOLDADO INDÍGENA AFRICANO
N.º 50 –A – 335
JACINTO MUNDAU
NATURAL DE MAGUDE – DISTRITO
DE GAZA (MOÇAMBIQUE)
MORTO DO CUMPRIMENTO DO
SEU DEVER EM 25 DE JULHO
DE 1952
PRESENTE

Esta lápide foi desterrada a 25 de Outubro de 1952 pelo Governador de Macau, Joaquim Marques Esparteiro, na face exterior duma das quatro paredes que no Quartel das Portas do Cerco formam a caserna que em vida ocupou esse soldado, morto durante os incidentes na fronteira em Julho de 1952. O tiroteio entre as tropas chinesas de Chin-Sán e as nossas forças das Portas do Cerco e da Ilha Verde prolongou-se durante 1’0 dias, não havendo da nossa parte senão uma vítima, a do africano Jacinto, morto no primeiro dia à falsa fé pela sentinela chinesa que disparou sem provocação alguma. A calma voltou após dez dias de injustificadas agressões chinesas. (1)
Foi condecorado, a título póstumo, com a medalha de Cobre de Valor Militar – Portaria de 6 de Maio de 1953 (Ordem do Exército nº 9 / II Série / 1953)
Ver anterior referência em
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2016/01/06/noticia-de-6-de-janeiro-de-1952-baptismo-de-pracas-africanos/
(1) TEIXEIRA, P. Manuel – A Voz das Pedras de Macau, 1980, p. 160

Uma nota oficial, distribuída à imprensa constava o seguinte:
No dia 19 de Dezembro de 1954, vindo de Cantão, chegou o capitão Álvaro Marques de Andrade Salgado, antigo Comandante da Polícia de Segurança Pública desta província, que se encontrava ausente na China desde 22 de Março de 1952“.
Embora a notícia oficial local não mencionasse mais pormenores, o relatório sobre a sua situação no Comando Militar de Macau, mencionava-o como desertor.
Na tarde do dia 22 de Março de 1952, o capitão de infantaria Álvaro Marques de Andrade Salgado, antigo comandante da Polícia de Segurança Pública (comandante do corpo da PSP entre 27 de Junho de 1946 e 1 de Janeiro de 1948) (1) e que nessa ocasião exercia o cargo de chefe de serviços de informações do comando da guarnição militar, foi capturado pela Armada do Exército Popular de Libertação (EPL) quando velejava entre a península de Macau e a ilha da Taipa. Aparentemente a “pequena embarcação … descaiu, aproximando-se da ilha de D. João (Sio-Vong-Cam/ Xiaohengqin), (2) sendo detido pelos chineses” (3),
Só seria libertado a 19 de Dezembro de 1954. Esteve em cativeiro em Cantão, 31 meses.
O período em causa (1952-1954) decorreu o conflito entre Macau e a China, o chamado “Incidentes das Portas do Cerco” (que se vinham “avolumando desde há meses e se intensificaram no mês de Maio com confrontos ligeiros nos dias 1,12 16, 19, 21, 28 de Maio e no dia 2 de Junho entre as sentinelas chinesas e os militares portugueses – guarnição da portas do Cerco com praças moçambicanas) e terminando no dia 23 de Agosto de 1954, com o pedido formal de desculpas ao general Li Zuopeng, chefe de Estado-Maior do distrito militar de Guangdong, por Pedro José Lobo, na qualidade de representante da administração portuguesa de Macau. (3) (4)

(1) Referência anterior
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2016/07/07/%EF%BB%BFnoticia-de-7-de-julho-de-1951-arraial-no-tenis-militar-e-naval/
(2) Ilha de D. João (Sio-Vong-Cam/ Xiaohengqin) – actualmente a Ilha de D. João e a Ilha de Montanha (Tai-Vông-Kâm / Dahengqin ) estão ligadas por aterros formando a Ilha de Hengqin /横琴
(3) FERNANDES, Moisés Silva – Os Incidentes das Portas do Cerco de 1952: o conflito entre os compromissos internacionais e os condicionalismos locais – Working Papers do Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, 2005
Disponível para leitura em:
href=”http://www.ics.ul.pt/publicacoes/workingpapers/wp2005/wp2005_2.pdf”>http://www.ics.ul.pt/publicacoes/workingpapers/wp2005/wp2005_2.pdf
Imagem retirada de
http://www.fsm.gov.mo/psp/por/psp_org_9.html
(4) A comissão da negociação foi presidida por Pedro José Lobo e integrava Ho Yin (He Xian) (um dos principais dirigentes da comunidade comercial chinesa do território) que foi o intermediário na libertação do capitão Salgado.

No dia 6 de Janeiro de 1952, efectuou-se na Igreja de Sto António, o baptismo de 41 praças indígenas do Batalhão de Caçadores N.º 1, sendo a função litúrgica presidida por S. Exa. Revdma. o Prelado Diocesano, D. João de Deus Ramalho, S. J., com a assistência de S. Exa. o Comandante Militar, Brigadeiro Paulo Benard Guedes e esposa e  outros oficiais da guarnição. (1)

MOSAICO III-17-18 1952 -Baptismo dos Praças Africanos IS. Exa. Revma. o Bispo de Macau, com as suas vestes pontificais, à porta do templo onde se realizou a cerimónia do baptismo”

O Batalhão de Moçambique desembarcou no dia 27 de Junho de 1951, à noite, passando a pertencer-lhe o Asilo de Mong Há e a enfermaria temporária do Hipódromo. Chegaram 7 oficiais, 4 sargentos, 7 cabos e 671 praças indígenas. Passou a ser comandado pelo Tenente Coronel Júlio César da Costa Chaby. Passou a Batalhão de Caçadores n.º 1 em 22 de Setembro de 1951. (2)
Pertencia à 2.ª Companhia deste Batalhão o soldado Jacinto Mundau (3) que foi ferido (e viria a falecer) no dia 25 de Julho de 1952 na disputa de uma barricada, nos confrontos fronteiriços entre a guarnição portuguesa e o Exercito Popular de Libertação da China, junto à Porta do Cerco.
A título póstumo foi condecorado com a Medalha de cobre de Valor Militar – Portaria de 6 de Maio de 1953 (Ordem do Exército nº 9 / II Série / 1953)
Condecorado com a Medalha de cobre de Valor Militar, a título póstumo, nos termos do § 2° do artigo 8° do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por satisfazer às condições expressas no § 1° do artigo 7° do mesmo regulamento, o Soldado Indí­gena de Moçambique, Jacinto Mundau, nº 50/A/335, da 2ª Companhia do Batalhão de Caçadores nº 1, da guarnição militar da Província de Macau, porque, quando se procedia ao encerramento da fronteira na tarde de 25 de Julho do ano findo, foi atingido grave­mente com tiros, disparados por militares chineses, que lhe causaram a morte, quando, desarmado, lutava corpo a corpo, a fim de libertar e trazer para território na­cional um seu camarada, que, apanhado de surpresa, era arrastado para território chinês, demonstrando valentia, coragem e dedicação patriótica.”  (4)

MOSAICO III-17-18 1952 -Baptismo dos Praças Africanos IIAs praças em formatura recebendo o sacramento do baptismo

(1) Fotos e reportagem retirados de «MOSAICO», 1952.
(2) CAÇÃO, Armando A. A. – Unidades Militares de Macau, 1999, p. 35
(3) Muito possivelmente terá sido baptizado neste dia 6 de Janeiro de 1952 , já que o seu funeral foi católico.
(4) http://www.acd-faleristica.com/archives/308