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Consta que neste dia he o de S.mo João Baptista alcançou esta cidade a maior victória que se pode considerar pelas circunstâncias em que estava naqueles lastimosos tempos” (1)

Fortaleza do Monte – 1985
Foto de Tang Hin Hei

Esta fortaleza “Fortaleza de Nossa Senhora do Monte de S. Paulo) (2) teve um papel decisivo no repelir do ataque holandês de 24 de Junho de 1622, pois foi a sua artilharia que fez explodir as reservas invasoras quando desembarcaram na Praia de Cacilhas e já estavam “«muy cerca de la ermida de nuestra Senora del monte de S. Paulo» (3)
Foram três os tiros que partiram do Monte e o terceiro atingiu o “paiol” que os holandeses traziam.
Segundo Padre Teixeira, foram dois os padres jesuítas responsáveis por este feito. Os padres italianos Burri (depois aportuguesado para Bruno) e Giacomo (Jerónimo) Rho. (4)
“Sabemos que merecimentos teve o Padre Bruno. Ao outro caberia merecimento de ter apontado e disparado os canhões”. (1)

A TRADIÇÃO DO OVO DE S. JOÃO BAPTISTA
A propósito deste dia, vou falar de uma recordação de infância que partilho com a minha irmã. Neste dia de S. João Baptista, em conjunto com a minha mãe, costumavamos partir um ovo para dentro de um copo transparente e ao meio dia em ponto, pegávamos o copo e virando-o para o sol, tentávamos ver no ovo, a figura de S. João Baptista num barco (alegoria da chegada do Santo para salvar Macau). Embora nunca conseguíssemos ver essa figura, o costume mantinha-se anualmente.

(1) TEIXEIRA, P. Manuel – Os Militares em Macau, 1975, p. 211)
(2) Parece ter sido desenhada de acordo com os planos de Francisco Lopes Carrasco, um homem com grande experiência militar adquirida em África e na Índia que foi nomeado ouvidor e capitão de guerra, em Macau, mas caiu em desgraça devido às inúmeras queixas contra o seu comportamento e em poucos meses depois de tomar posse, terá partido para Goa em 1617. O melhoramento e aperfeiçoamento das muralhas, terá sido de D. Francisco Mascarenhas, com conclusão do quarto e último baluarte em 1626, data esta que aparece na pedra da fortaleza. (1)
GRAÇA, Jorge – Fortificações de Macau: Concepção e História. ICM, 1985.
(3) BOXER, C. R. – Boletim E. D. de Macau, Agosto, 1938  in (1)
(4) https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/giacomo-rho/

N´este anno de 1622, virão os Olandezes sobre Macao para o tomar à força de armas, como o desejão à muito, porque desta maneira se malquistarião com os chinas, pois lhe não fazião a elles guerra, enm multiplicarão povoações de Estrangeiros, que tanto teme esta nasção. E alem disso ficarião empedindo os Portuguezes, ou atravessando este Cômercio, que he o mais groço, de todo o Oriente. Não falo no saque da Cidade, que seria grande, por estar ella ao presente mais povoada, e rica, do que os mesmos inimigos imaginavão; com esta determinação chegarão aqui em 22 de junho 13 vellas Olandezas, entre navios, e Patachos, e Galeotas, em que vinha por general hum Cornelio Regres, e já antes estavão neste Porto coatro navios, que levavão sua Derrota para o Japão… (…)
Picou-se n´este tempo o sino da Cidade, e a gente que por varios logares estavão repartidas veyo concorrendo, posto que sem ordem, nem bandeiras, nem huma Companhia , que tudo faltou de nossa parte, senão a muita providencia de Deos, que por esta via de andarem os nossos espalhados, nos quiz dar a victoria mais barata, e vinha o inimigo já com o rosto nos bambuaes e Cidade, quazi emparelhando com a Hermida de Nossa Senhora da Guia, quando do Monte de São Paulo, que lhe fica sombranceiro, atodo aquelle Campo, se desparou huma pessa grossae apóz ella outras menores, que os fizerão parar, e juntamente reparar na muita gente que tinhão diante de sy, e valle, e pelo monte acima hia subindo até a Hermida, donde forçozamente lhe havia de ficar nas costas se quizece marchar por diante e já neste tempo muitos dos seus dando-se por cercados, não quizerão virar o rosto, ou pelo menos hirem-se retirando…. (…)
… Por elle lhe forão os Portuguezes dando nas costas, e os Olandezes fugindo tão soltamente que muitos largarão bandeiras, armas, e tudo, para hirem mais ligeiros, desta maneira até à praya de Cassilhas , onde tinhão dezembarcado, com diferente brio… (…) (1)

Armada Holandeza por Johan Nieuhof 1665Armada holandeza nas águas de Macau, desenho de Johan Nieuhof  em 1665 (2)

No tempo da briga (de 1622) recolherão (os comerciantes) seus cabedais ao Collegio (da Madre de Deus),como também as Senhoras principais (e “Religiosas de Sta.Clara” – se recolherao na Egreja (e Colégio), ao tempo da batalha, por ficar o dito collegio debaixo (a coberto) da artelheria do dito Monte, e dali não sahirão até a vitória ser alcançada” (Livro de copias de alvarás, cartas e mais papeis pertencentes ao governo economico de Macau, de 1769, citado em Ta- Ssi-Yang-Kuo). (1)
Segundo Guilhaume Isbrantsz Bontekou de Hoorn,, oficial holandês da esquadra, um dos participantes nessa invasão, numa obra escrita por ele e publicada em Amsterdão em 1725:
“Logo ao amanhecer do dia 24, canhoneamos a cidade com todas as bandas de artilheria, sem parar, e tanto quanto as peças poderiam supportar. tendo desembarcado, pouco depois, o nosso comandante com 600 homens, fez-se avançar rente à terra dois yachts, afim de estarem ahi promptos para qualquer eventualidade; principalmente para protegeram a retirada, se a empreza não fosse coroada de bom exito e, tambem, para favorecerem a aproximação das nossas chalupas e dos outros pequenos barcos que conduziam a nossa gente e deviam reconduzil-a quando fosse necessario. Os Portuguezes tinham construido um entricheiramento no sitio onde se devia realizar o desembarque; mas fizeram pouca resistencia, e quando a nossa gente penetrou n´elle, fugiram logo para um mosteiro ou convento situado n´uma eminencia… (…)

POSTAL DST 1986 Forte do Monte - Canhão“Overlooking the Macau Taipa Bridge from Monte Fort“(3)

 … Mas aconteceu-nos um accidente de grande importancia. Pegou o fogo a alguns meios-barris de polvora e não houve maneira de ir buscar outros nem de reparar de prompto essa perda. Pior foi o aviso que os portuguezes receberam do caso por um japonez desertor das nossas tropas. Tencionava-se occultar a retirada que era necessario fazer-se, o que com bastante facilidade se realisaria; mas, tendo esse aviso alterado tudo, cahiram os inimigos sobre a nossa gente que, sem polvora, nehuma resistencia podia oppôr; de maneira que resultou um grande numeroi de mortos. perdemos 130 homens e tivemos numero egual de feridos. N´esse numero contava-se Cornelio Reyertsz, nosso comandante; que foi ferido logo no começo, por ocasião do desembarque, com um tiro de mosquete, na barriga, de que, graças a Deus, não morreu… (...)” (1)

Monumento da Vitória 1927Monumento da Vitória , 1927

Neste relato o cronista holandês não fala como “pegou o fogo a alguns meios-barris de polvora, talvez manhosamente não quis atribuir o incêndio dos barris aos tiros de Monte. A narrativa da época evoca “se disparou huma pessa grossa e apóz ella outras menores“. Outras narrativas falam de ” 3 bombardas saídas duma única peça que ali, de novo, se tinha posto ou ” o P.e Rhó apresta 4 canhões que aí tinha colocado“.
“Do seu contexto porém, comparado com as versões portuguesas, não fica dúvida alguma de que os tiros de artilharia do Monte, dirigidos provavelmente pelo Pe.Jerónimo Rho,S.J., foram os que decidiram a salvação de Macau, nesse dia 22 de Junho de 1622. ” (4)
Um facto pouco conhecido é o seguinte: “ o célebre Padre João Adão Schall von Bell, (1591-1666), (conhecido em português por João Adamo), natural de Koln, e uma das maiores glórias da Companhia de Jesus na China por ocasião do ataque dos holandeses a Macau, tomou parte activa no combate, chegando a aprisionar por suas próprias mãos um dos oficiais holandeses.” (5)

(1) Ta-Ssi-Yang-Kuo, Vols. I-II, 1899-1900, pp. 163-170.
(2) Johan Nieuhof (1618–1672), escritor holandês, sinologista, explorador e desenhista. A partir de 1649 empreendeu várias viagens ao Oriente onde, em 1664, era um dos principais agentes da Companhia Neerlandesa das Índias Orientais.
Entre 1655 e 1657 empreendeu uma viagem de cerca de 2400 quilômetros, de Cantão até Pequim, na China, cujo relato fez dele um dos maiores escritores da época em relação aquele império.
https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Macau#/media/File:Nieuhof-Ambassade-vers-la-Chine-1665_0739.tif
(3) Postal emitido pela Direcção dos Serviços de Turismo, em 1986.Impresso na Gráfica de Macau Ldª.
(4) PIRES, Benjamim Videira in http://www.library.gov.mo/macreturn/DATA/PP195/PP195063.HTM
(5) BOXER, Charles Ralph – Ásia Sínica e Japónica, Volume I, 1988 p.178. (245 p.).o

Em 12 de Dezembro de 1643, a cidade resolveu enviar um artilheiro a Cantão (Guangzhou) em satisfação do pedido feito pelos mandarins, por intermédio do padre Francisco Sambiate, (1)  que se encontrava naquela cidade com três artilheiros, para seguir para Nanquim (Nánjing). Ficou igualmente resolvido que com o artilheiro fosse enviada uma peça de ferro, como oferta da cidade de Macau.
GOMES, Luís G. – Efemérides da História de Macau.

Nesse ano, em Pequim, Johann Adam Schall von Bell, brilhante astrónomo que gozava de estima pessoal do Imperador, e que já tinha criado um calendário estilo europeu, escreveu um livro explicando o fabrico e funcionamento dos canhões.
SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Volume I.

Johann von BellJohann Adam Schall von Bell (1591 – 1666) –  汤若望 (mandarim pinyin: Tàng Ruòwàng; cantonense jyutpping: Tong1 je5 mong6)); foi um missionário jesuíta alemão que viveu 47 anos na China. Nascido de pais nobres na Alemanha, frequentou o Ginásio dos Jesuítas e entrou para a Companhia de Jesus em Roma, em 1611. Depois do noviciado e de alguns anos dedicados à filosofia e à teologia, foi enviado às missões e, em Abril de 1618, partiu de Lisboa para a China, chegando a Macau em 1619.
Depois de passar alguns anos em Macau, em 1622, partiu para o interior da China  para a missão católica de Xi’an (Shaanxi). Foi convocado para Pequim (Beijing), em 1629, para substituir o falecido padre Terrentius, que participava na reforma do calendário chinês (outro jesuíta que participou nessa reforma, foi o célebre jesuíta Rho, “herói” da fracassada invasão de Macau pelos holandeses, em 1638). Pelo seu sucesso foi feito mandarim e presidente da Comissão dos Matemáticos e foi-lhe permitido construir a primeira igreja em Pequim. Mais informações sobre este jesuíta em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Johann_Adam_Schall_von_Bell
http://www.newadvent.org/cathen/13520a.htm
Foto retirado de:
http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Adam_Schall_(detail).jpg
(1) Francisco Sambiasi (Francesco Sambiasi -Bi Fangji 畢方濟) nascido em Cosenza, Calabria, em 1582; chegou a Macau em 1610 e faleceu em Cantão em Janeiro de 1649.

No dia 31 de Agosto de 1616, Francisco Lopes Carrasco tomou posse da Capitania e Ouvidoria de Macau. Por nada ter feito para as obras da fortificação da cidade e por serem muitas queixas contra ele como Ouvidor, o Vice-Rei da Índia mandou que regressasse preso para Goa, tanto mais que foram muitos os excessos e as desordens por ele cometidos. Terá contribuído, apesar de tudo, devido à sua prática, como militar em África e na Índia (era natural de Goa) para o projecto da Fortaleza de S. Paulo do Monte, juntamente com o Pe. Giacomo (Jerónimo) Rho, S.J.

Em 1617, data provável do início da construção da Fortaleza de S. Paulo ou de Monte – a cidadela de Macau.
GOMES, Luís Gonzaga – Efemérides da História de Macau.

Referências à Fortaleza do Monte e ao Padre Rho, ver em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2014/04/26/noticia-de-26-de-abril-de-1638-padre-giacomo-rho-%E7%BE%85%E9%9B%85%E8%B0%B7/
e
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2012/02/10/leitura-a-fortaleza-do-monte/

A 26 de Abril de 1638, faleceu em Pequim, o célebre jesuíta milanês Jacques Rho que da inacabada fortaleza do Monte, disparou o tiro que terá causado a explosão dum barril de pólvora entre os invasores holandeses provocando assim o pânico e a debandada do inimigo, no glorioso dia 24 de Junho de 1622. (1)

Trata-se do padre jesuíta Giacomo Rho (2), nascido em Milão no ano de 1592 (2) ou 1593 (3), que entrou para a Sociedade de Jesus com a idade de 20 anos, como um fraco aluno mas que viria a ser um excelente matemático. Seguiu para o Oriente em 1617 com destino à Missão na China e após estadia em Goa chega a Macau exactamente nesse ano (1622) da tentativa de desembarque dos holandeses na praia de Cacilhas.

Com os seus conhecimentos de matemática, terá ensinado aos habitantes de Macau o uso eficiente da artilharia, e ficado com a “fama” da autoria do tiro “milagroso”.

Fortaleza do Monte 1988Fortaleza do Monte 1988 (Revista Macau)

Rapidamente aprendeu a língua chinesa e em 1624 seguiu para a China. Foi pelo seu excelente conhecimento da matemática que, em 1631, foi convidado pelo Imperador para reformar o calendário chinês juntamente com Johann Adam Schall von Bell, tarefa que o ocupou até à morte em 1638. Consta-se que numerosos dignitários chineses assistiram ao seu funeral. (3)

(1) “24-06-1622 – Retumbante vitória alcançada sobre os holandeses comandados por Kornelis Reyerszoon que, com 14 navios e 800 homens, pretendeu tomar a cidade. O inimigo foi completamente desbaratado ante o indómito esforço dos macaenses, capitaneados pelo denodado herói Lopo Sarmento de Carvalho.”
GOMES, Luís Gonzaga – Efemérides da História de Macau. Notícias de Macau, 1954, 267 p.
Ver anterior post:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2014/03/26/noticia-de-26-de-marco-de-1871-jardim-e-monumento-da-vitoria-i/ 
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2012/11/28/noticia-28-de-novembro-de-1615/
(2) No trabalho de Yves Camus (s. j. do Instituto Ricci de Macau), numa lista da presença em Macau de jesuítas da Missão da China (após 1594, no Colégio de S. Paulo)(Quadro B, pp. 24-26), consta o nome de Giacomo Rho 羅雅谷 (1592 1638) que esteve em Macau de 1622 a 1624, tendo trabalhado na China dos 32 aos 46 anos, e sendo um astrónomo que colaborou com Johann Adam Schall von Bell no calendário (reinado do imperador Ming 明 , Tianqi 天啓  – 1621-1628 )
CAMUS, Yves, s.j. – Macao and the Jesuits (A Reading through the Prism of History). Macao Ricci Institute, s/ data, 26 p.
http://www.riccimac.org/doc/CAMUSY_MacauandtheJesuits.pdf
(3) http://en.wikipedia.org/wiki/Giacomo_Rho