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 “A mesma Primavera (1934) trouxe também outro acontecimento, este, de grande importância para a vida cultural e artística de Macau – a aprovação dos estatutos da Academia dos Amadores de Teatro e Música. Daí por diante Macau tinha uma agremiação destinada especificamente para a arte musical e cénica. A Grande Tournée Teatral às Colónias, que partira em 1932, deixara raízes e havia grande entusiasmo entre certos amadores para a arte de representar. Isto, principalmente, porque ficara entre nós um dos actores, José de Arede Soveral, agora funcionário público, depois que bebera a “água do Lilau”.

1-09-1934 – Quanto à vida artística, preparava-se para a estreia das actividades da Academia de Amadores de Teatro e Música. Durante o verão, porque a agremiação ainda não possuía instalação própria, os ensaios realizavam-se na casa de Bernardino de Senna Fernandes, à Praia Grande. Em dias marcados da semana, enchiam-se as salas de sócios, em serões onde o sério se misturava com o bom humor e vontade de cumprir. Chamou-se sarau à estreia da Academia, que teve lugar no dia 1 de Setembro. Foi uma noite admirável e inesquecível de arte, contribuindo todos os participantes com o melhor do seu esforço para o êxito da empresa. Eram cerca de cinquenta os amadores. Houve uma parte cénica e outra musical. Na parte teatral apresentaram-se duas peças de um acto cada. Quanto à parte musical, houve solos de violino, canto e violoncelo, conjuntos corais e de orquestra, um trio que tocou o “Trio Opus 49” de Mendelssolm. Os amadores que se responsabilizaram pela parte cénica foram: Lucília de Campos Néry, Maria Helena de Menezes Ribeiro, José de Arede e Soveral, D. João de Vila Franca, Mário de Campos Néry, os irmãos José e Francisco de Carvalho e Rego, Henrique Teixeira Machado e Henrique de Serpa Pimentel.

A orquestra teve a seguinte composição: Regência – Bernardino de Senna Fernandes; piano – Maria de Natividade de Senna Fernandes; violinos – Joseph Pasquier, Luís Baptista, Alberto Barros Pereira, Francisco Freire Garcia, Carlos de Mello e Jorge Estorninho; violoncelos – Cipriano Bernardo e Evaristo Carvalho; flauta – Edmundo de Senna Fernandes; saxofone – Emídio Tavares; cornetins -Alberto Ângelo e Pedro Coelho; trombone – Jacinto Azinheira; contra-baixo – Lúcio Carion e bateria – Fernando de Albuquerque.

Os coros eram formados por: Arcádia Borges, Arminda Borges, Amália Rodrigues, Eduarda Amaral, Maria Helena de Menezes Ribeiro, Júlia Maria Garcia, Lília Mello, Lucília de Campos Néry, Maria Amália de Carvalho e Rego, Maria José Amaral e Renée de Senna Fernandes, Amadeu Borges, Cláudio Vaz, Eduardo da Silva, Francisco de Carvalho e Rego, José Freire Garcia, Henrique Teixeira Machado, Henrique de Serpa Pimentel, José de Arede e Soveral, José de Carvalho e Rego, D. João de Vila Franca, Luís Gonzaga Gomes, Mário de Campos Néry e Pedro Ângelo Jr.

Um dos números mais aclamados pela sensibilidade dos artistas foi o trio que tocou a obra de Mendelssolm. Esse trio era composto por Maria Amália de Carvalho e Rego (piano), Bernardino de Senna Fernandes (violino) e Cipriano Bernardo. O êxito foi um impulso para que os amadores continuassem na sua obra artística e educadora. Daí que, imediatamente, se prepararam para levar à cena, a primeira peça de fôlego do seu programa “O Poço do Bispo.”

FERNANDES, Henrique de Senna  – Cinema em Macau (1932-1936). Revista de Cultura N.º 23 (II Série) Abril/ Junho 1995. Instituto Cultural de Macau, pp. 133-170.

PARA VENDA – Muito bom, e fino SABÃO de Fabrica Portugueza de Macao, para lavagem de roupa, a 12 Cattes por pataca; vende-se também a meudo até hum pão, que não pezará mais de meio catte, a 120 Sapecas ao catte. Quem quizer dirija-se a “Boa Vista” Caza N.º 4, ou a “Fonte de Lilao” Caza do mesmo numero, desde o dia 13 do corrente mez em diante às 9  horas A. M. a 5 P.M. não sendo Domingo, e dia Santo de guarda. Macao, 7 de Fevereiro de 1851.

Extraído de «Boletim do Governo da Província de Macau, Timor e Solor», Vol. 6. N.º12 de 8 de Fevereiro de 1851

A Fonte ou Bica de Lilau ficava na zona de Lilau que presentemente a via principal é a Rua de Lilau que vai da Rua da Barra e termina na Rua da Penha.
Quanto à «Boa Vista», zona/área anexa à de  Lilau, a principal referência é a Rua da Boa Vista que começa na Rua da Penha, entre a Travessa do Colégio e a Calçada da Penha, e termina na Rua Comendador Kou Hó Neng, ao cimo da Calçada do Bom Parto. Há inda hoje o Pátio da Boa Vista que está situado junto da Rua da Boa Vista , sobranceiro à mesma, ao lado da Calçada da Penha. Creio que ainda havia um Beco da Boa Vista.
Havia ainda uma «Praia da Boa Vista» na zona da Areia Preta “que era frequentada pela nata da sociedade macaense que se reunia ali em gárrulas e despreocupados piqueniques”.
TEIXEIRA, P. Manuel – Toponímia de Macau, Vol I, 1997

Extraído do «Boletim do Governo de Macau e Timor» n.º 9 de 2 de Março de 1868, p. 49.
NOTAS:
FONTE DE LILAU – originariamente denominada Bica do Nilau (nome primitivo da colina que depois é conhecida como Colina da Penha por ter sido lá construída  a Ermida de Nossa Senhora da Penha da França). Foi destruída.

Hoje no Largo do Lilau existe uma fonte que tenta memorizar a bica original.
BALSA – fogo de artifício chinês, muito comum em Macau até à década de 20 (séc. XX) depois caiu em desuso. Este fogo de artifício era chamado porque os foguetes eram colocados em balsas ou baldes Construía-se uma armação em bambu, espécie de torre de dois ou três andares, e em cada andar punha-se uma balsa de foguetes. Acendia-se a primeira, esta ao explodir pegava fogo à segunda e assim sucessivamente. (1)
Referência à «balsa» na «Carta de Siára Pancha a Nhim Miquéla» escrita em «3 de janero de 1865» (2)
Outro dia Voluntario inglez (3) d´Hong Kong já vem Macáo ! Qui lai di bonito ! eu já vai olá também. Macáo parece França, tudo gente fallá. Tem tifin (4), revista di tropa, salva de vinte un há tiro, balsa à note qui bonito, gastá cô tudo aquelle flamancias três mil fóra pataca.
“TUTI”TOU TEI – 土地 – Deus da Família – nos mitos antigos, Tou Tei é um deus que governa a terra, por isso esta festividade se denomina “Festa do Deus da Terra”. Ver anterior referência em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2017/02/27/noticia-de-27-de-fevereiro-de-2017-tou-tei-o-deus-da-familia/
(1) BATALHA, Graciete Nogueira – Glossário do DIalecto Macaense. Coimbra, 1977.
(2) Ta-Ssi-Yang-Kuo , Tomo I, 1899, p. 324.
(3) Refere-se à visita dos soldados voluntários da colónia inglesa de Hong Kong a Macau no dia 19 de Novembro de 1864, armados e com artilharia, com exercícios no campo de S. Francisco. Estiveram em Macau até o dia 21. Ver anterior referência a esta visita em postagem já publicada em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2018/01/19/noticias-de-19-a-21-de-novembro-de-1864-visita-do-corpo-de-voluntarios-de-hong-kong-a-macau/
(4) “TIFIN” É o mesmo que “lunch” (almoço)

31 de Julho de 1918 —A Repartição dos Serviços de Saúde reclama contra a utilização, pelo público, da água da Fonte da Solidão” (1)

Fonte da Solidão década de 50FONTE DA SOLIDÃO – década de 50 – já nessa altura a fonte estava seca

O abastecimento regular da água potável à cidade de Macau foi sempre, no passado, um problema  de difícil resolução especialmente nos anos de maior seca, sendo a cidade muito pobre em águas potáveis e os veios que forneciam o caudal necessário para os poços, estavam quase todos ao nível do mar. (2)
Nessa data, a canalização existente para a cidade era de água salgada implementada pela primeira rede em 1912  (3)

Fonte da Solidão 2015 - IA fonte actualmente, 2015

Desde cedo,  a fonte de solidão está referenciada como de “água cristalina e boa”.
“Verificou-se em 1882, em grande parte, este importante melhoramento higiénico, devido à determinação do governo da província e à execução pronta e inteligente do actual director das obras públicas. Assim, uma poça lamacenta, que tinha por baixo a dois metros e meio uma veia de água, e de que se tirava em mais de um quarto de hora uma dada 283 porção de um líquido turvo, transformou-se numa fonte que fornece hoje em dois minutos a mesma quantidade de água cristalina e boa. Foi também aproveitada na estrada de Cacilhas outra nascente de água, que havia sido explorada no tempo do governo do conselheiro Coelho do Amaral e depois abandonada, a qual fica do lado oposto àquele em que brota a primeira fonte e a denominada da Flora que também foi melhorada.” (4)

Toponímia Estrada de CacilhasCom os trabalhos de aterro do Porto Exterior iniciados em 1921 (a Estrada da Solidão, hoje Estrada de Cacilhas era banhada pelo mar) e terminados em 1926, as águas que brotavam da Fonte da Solidão foram-se extinguindo (5) e depois com o traçado e as obras para o circuito da Grande Prémio de Macau iniciados em 1954, a fonte foi em parte enterrada e hoje, a parte superior da fonte está parcialmente escondida (permanentemente) pelas “barreiras de pneus” colocadas no circuito.

Fonte da Solidão 2015 - IIAs «barreiras», a fonte e o paiol antigo («de cima»)

Na verdade ,com a “construção” do paiol (princípios de 50) denominado «de baixo» (junto à Estrada, para diferenciar do Paiol «de cima» que estava num piso superior à fonte), descobriu-se outro veio no seu interior, de água límpida e bebível e que, nos anos de maior chuvas, corria abundantemente para fora sendo local de paragem de muita gente que com os garrafões iam aí buscar a água para beberem (décadas de 50 a 70).
Como a Estrada de Cacilhas até à década de 60 não tinha água canalizada, desde o meu nascimento até à minha saída de Macau, cresci bebendo  a água do Paiol.

Paiol de CimaO Paiol «de Cima»,  com a escada de acesso (infelizmente mal conservada) e a rampa feita muito mais tarde para acesso da carga e descarga de armas, munições e explosivos (por força de lei, as empresas que lidavam com  explosivos empregues em trabalhos particulares eram obrigadas a terem esse material depositados no Paiol). À direita, a Fonte da Solidão.
Paiol de baixoO Paiol «de baixo», actualmente em utilização, com o posto de vigia em cima do pequeno muro /forte de protecção da entrada (construído na década de 60)

(1) Arquivo Histórico de Macau, F.A.C. P. n.º 42 — S-A in SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Vol.4, 1997.
(2) 1883 — “É Macau excepcionalmente pobre em águas, sobretudo em águas potáveis, porque os numerosos poços que abastecem a população vão procurar uma veia quase ao nível do mar formada por águas de infiltração sempre mais ou menos salobras, carregadas de matérias orgânicas, e portanto impróprias para beber, vindo assim a pouca pureza da água juntar mais um elemento de insalubridade a tantas outras que são inevitáveis nas grandes aglomerações de indivíduos.” (4)
“O fornecimento de água às populações era feito através de inúmeros poços públicos e privados, cisternas e depósitos nas casas para recolha da água das chuvas, fontes e, em especial, durante a estiagem, por meio de barcaças portadoras de água proveniente da ilha da Lapa mas a falta de higiene nesses poços e cisternas  e as veias que fornecia llevava muitas vezes á perigosidade para a saúde pública(MACHADO, Álvaro de Melo – Coisas de Macau, 1913.

Fonte da Solidão 2015 - III

Os poços, numa cidade como Macau, onde o problema da água se põe, sempre com grande acuidade, eram um dos índices de estatuto social dos seus habitantes. A fonte que servia Macau era a Bica do Nilau ou Lilau, situada na colina da Barra (S. Lourenço) onde também havia, no século passado, um grande poço público fronteiro à Igreja (que Chinnery registou num belo desenho). Extramuros havia boas nascentes, na Flora, outra na Guia (Fonte da Solidão). Mais tarde foi construído um chafariz na Rua do Campo, próximo dum antigo veio de água, de que só alguns velhos documentos falam e que veio a desaparecer. (AMARO, Ana Maria — Das Cabanas de Palha às Torres de Betão, 1998, pág. 85.)
1908 — A partir do processo n.º 29 da Secretaria Geral do Governo da Província de Macau, de 1 de Outubro de 1908, relativo à análise das águas de Macau e Ilha da Taipa, elabora-se o seguinte quadro das fontes, poços particulares, poços públicos e de exploração, então existentes. Dada a dificuldade pela falta de nascentes, de abertura de fontes e poços, é provável que esta lista datada de 1908, coincidisse ou quase com os existentes nos finais do século XIX. Os valores quantificados quanto ao número de fontes e poços da presente lista de 1908, ficam muito aquém dos apontados no extracto anterior, só para as freguesias de Santo António, Sé e S. Lourenço, relativo ao ano de 1905; tal poderá ser talvez explicado pelo facto de, quase todas as casas possuírem “poço” embora quase todos, não sendo de nascente, se limitassem à simples recolha da água das chuvas e por isso mesmo, a sua designação mais precisa deveria ser a de cisternas. Fontes: Fonte da Avenida Vasco da Gama, Fonte da Inveja, Fonte da Flora Fonte das duas caras — chafariz da Flora, Fonte do Lilau, Fonte da Solidão e Fonte da Guia” (4)
Fonte da Solidão 2015 - IV(3) “1912 — (VII-30) — Termina o prazo de entrega das propostas para fornecimento e instalação de máquinas elevatórias de água, e canalização desde a praia da Vila Leitão aos reservatórios da Guia. A água era salgada e servia para rega das estradas e combate a incêndios. Foi a primeira rede de águas de Macau” (SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Vol. 4, 1997)
Como política de higienização urbana, foi considerado na altura como solução radical a limpeza da cidade a partir duma rede de água salgada prevista desde 1909, mas só concretizada depois de 1912; diga-se que foram notáveis os efeitos desta solução na desratização urbana e no combate à peste.” (4)
(4) AFONSO, José da Conceição – Macau, contributos para a história do abastecimento de água potável. Administração, 75, vol XX, 2007, 1.º, 281-199.
http://www.safp.gov.mo/safppt/download/WCM_004505
(5) “Logo de começo ainda antes de elaborar o anteprojecto de Obras do Porto Exterior, foi, planeado por esta Direcção uma captação vulgar de aguas pluviais, na Colina Este da Guia, que na parte considerada podia produzir cêrca de 20.000 m3 por ano para o porto e bem assim o aproveitamento da Fonte da Solidão que tem sido praticamente desaproveitada, ficando a agua com bastante carga para ser distribuída em elevação e podendo a obra ser feita a expensas do Conselho de Administração das Obras dos Portos; mas com a resolução atraz dita, cabia esse trabalho á Direcção de Obras Publicas e esta intendeu por melhor estender ali o sistema que estava empregando na face Oeste da Guia, isto é de provocar maior infiltração por meio de canais horizontais permeáveis, e quanto ás aguas da Fonte de Solidão decidiu canalizá-las para a cidade pelo túnel que foi aberto; tendo então sido prometido que o volume de 20.000 m3 seria fornecido pelo grande manancial que fôra descoberto em camada profunda do subsolo na baixa de Monghá; mas vê-se agora que as esperanças neste manancial não eram tão bem fundadas pelo menos quanto ao processo de captação propriamente dito e o abastecimento de agua ao terreno do porto ficou assim de alguma forma prejudicado.” LACERDA, Hugo C. de –  Obras dos Portos de Macau/Memorias e Principais documentos desde 1924.
Outras referências anteriores  ao abastecimento de águas em Macau.
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2014/06/12/noticia-de-12-de-junho-de-1915/
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/s-a-a-m/
NOTA : Todas as fotografias coloridas, do arquivo pessoal, de Maio de 2015.

Guia Fortress DSTMACAU 1986“Guia Fortress and lighthouse (the oldest lighthouse on South China Coast)” (1)

Subi ao Farol da Guia
sem me vir mal de tontura:
Os homens vistos de cima
são todos da mesma altura.

Rio da Pérola, Rio
Que mais pareces o mar.
Jorge Álvares foi o primeiro
que chegou para ficar

Vieram Pinto e Camões,
com a Dinamene e o Jau,
e também eles beberam
da água fresca do Lilau.

Outros lusos aportaram,
com as naus da iniciação.
falavam a mesma língua;
tinham um só coração.

Mudam o vento e a idade.
Caem cedros altaneiros
Só permaneceu verdade
que «os últimos são primeiros».

Enquanto o oceano for livre
e enquanto o céu for azul,
seremos p´ra Portugal
a sua última Tule !

Benjamin Videira Pires (2)
Macau, 23 de Junho de 1976

(1)    Postal emitido pela “Dept. of Tourism (D.S.T.) MACAU – 5000 -86-12”
(2)   PIRES, Benjamim Videira – Espelho do Mar. Instituto Cultural de Macau,  1986, 57 p + |1|
 
Referências anteriores do Padre Benjamin Videira Pires, em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/padre-benjamin-videira-pires/