No B.O. n.º 1, deste 2.º semestre do ano, é publicado, no dia 7 de Julho de 1923, o seguinte edital da Administração do Concelho de Macau: ”Faço saber que, a partir da data da publicação deste edital no Boletim Oficial da Província, será proibido aos vigias chineses tocarem nas vias públicas e casas de vigia os bambus e tambores que é costume usarem para anunciar as horas ao público, sob a pena de desobediência aos mandados de autoridade”. Trata-se de um velho costume da China, mencionado de visu por Fernão Mendes Pinto e por Fr. Gaspar da Cruz, entre outros. SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Volume III, 2015, p. 135
Jorge Álvares morre nos braços do seu grande amigo Duarte Coelho, na tarde do dia 8 de Julho de 1521: « … e foi enterrado ao pé de hum padrão de pedra com as Armas deste Reyno, que elle mesmo Jorge Àlvares alli puzera hum ano ante que Rafael Perestrello fosse aquellas partes no qual ano que ali esteve, ele tinha enterrado hum seu filho que lhe faleceo…» (1)
« … Estando os nossos no qual trabalho em perigo, em vinte e sete de Junho de quinhentos e vinte e um, chegou Duarte Coelho em um junco seu aperecebido, e com êle outro dos moradores de Malaca. O qual, tanto que soube dos nossos o estado da terra, e como o Itau, que era Capitão-mor do Mar, os cometera já por vezes, quisera-se logo tornar a sair; mas, vendo que os nossos não estavão apercebidos pera isso, po-los ajudar a salvar, ficou com êles. E principalmente por amor de Jorge Álvares, que era grande seu amigo, o qual estava tam enfêrmo, que da chegada dêle, Duarte Coelho, a onze dias, faleceu e foi enterrado ao pé de um padrão de pedra com as armas dêste reino, que êle mesmo Jorge Álvares ali pusera um ano ante que Rafael Perestelo fêsse àquelas partes; no qual ano que ali esteve, êle tinha enterrado um seu filho que lhe faleceu…» (2)
Numa postagem anterior sobre Jorge Álvares (3) sublinhei o seguinte:
“ … Por falar em Jorge Álvares, consta-se que foi Sarmento Rodrigues, nessa viagem a Macau, em 1952, quem mandou erguer uma estátua a Jorge Álvares. Coincidência ou não… eram ambos de Freixo de Espada à Cinta.”
Ora este Jorge Álvares embora venha mencionado em muitos trabalhos como natural de Freixo de Espada à Cinta, não há documento que comprove tal facto.
Artur Basílio de Sá, autor do livro “Jorge Álvares”, (2) retrata não o Jorge Álvares (cuja naturalidade não se conhece) escrivão, por mercê do capitão de Malaca e modesto armador de um junco, primeiro europeu a aportar a China por via marítima em 1513 mas outro Jorge Álvares, este sim, natural de Freixo de Espada à Cinta, abastado mercador e capitão de um navio, homem do mar, navegador por vocação, primeiro cronista do Japão, grande amigo do padre Mestre Francisco Xavier, a quem tanto procurou auxiliar nos seus trabalhos apostólicos, pondo ao serviço do santo o seu navio, o seu saber e a sua fé de zeloso e instruído cristão.
Assim mesmo na Introdução, o mesmo autor escreve:
“Com sobejos motivos e fundamentos se interessou pois, o Sr. Comandante Sarmento Rodrigues quando ainda Ministro do Ultramar, por uma justa consagração daquele seu conterrâneo na sua vila natal. E para que naquela terra transmontana se pudesse erguer um condigno monumento ao insigne navegador dos ares do Oriente e primeiro cronista do Japão, teve intervenção decisiva e generosa o Sr. Governador de Macau, contra-almirante Joaquim Marques Esparteiro, concedendo para esse efeito um subsídio, retirado da verba destinada ao levantamento em Macau da estátua do outro Jorge Álvares, o primeiro navegador ocidental que foi à China e cuja naturalidade ainda se não conhece.”
Cita o mesmo autor: “ … no período situado entre 1511 e 1550, o nome de Jorge Álvares aparece-nos a designar alguém que desempenha ofícios vários em datas diferentes:
– Em 1511, o escrivão da nau «S. João Rumessa» chamava-se Jorge Álvares
-Em 1514, o primeiro português qua vai à China como feitor da fazenda de el-rei embarcada no junco do bendara de Malaca, chamava-se Jorge Álvares.
-Em 1518, o homem de armas que sabia a língua malaia e traduziu três cartas dos reis das Moluscas tinha igualmente o nome de Jorge Álvares.
– Finalmente, em 1548, um dos grandes amigos do Padre Mestre Francisco chama-se também Jorge Álvares., que Fernão Mendes Pinto diz ser natural de Freixo de Espada à Cinta.”
A estátua que está em Freixo de Espada à Cinta (foto anterior) é deste navegante (e não o da China) embora a escultura dele seja de Euclides da Silva Vaz (1916), o mesmo escultor que fez a estátua do Jorge Álvares colocada em Macau (foto seguinte).
https://pt.wikipedia.org/wiki/Jorge_%C3%81lvares
A estátua foi colocada frente ao edifício das Repartições, na então zona de aterro da baía da Praia Grande, a 16 de Setembro de 1954 (data do descerramento)
(1) BARROS, João de – Da Ásia (edição de 1777), Década III, Liv VI, Cap. II in KEIL, Luís – Jorge Álvares O Primeiro Português que foi à China (1513). Instituto Cultural de Macau, 1990.
(2) SÁ, Artur Basílio de – Jorge Álvares, Quadros da sua biografia no Oriente. Agência Geral do Ultramar, 1956, 143 p.
(3) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2016/01/07/noticia-de-7-de-janeiro-de-1514-leitura-jorge-alvares-o-primeiro-portugues-que-foi-a-china-1513/
Anteriores referências a Jorge Álvares
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/jorge-alvares/
Livro de Jordão de Freitas sobre «Camões em Macau» (1) , no 331.º aniversário do falecimento do poeta, de 1911, da Imprensa Libânio da Silva, em Lisboa.
Jordão de Freitas (2) foi o primeiro a salientar que já em 1555 havia Portugueses na península de Amacao, pondo a hipótese de Camões haver estado em Macau.
“Antes de passar adiante, seja-me permitido advertir que Macau (Maquao, Amaquao, Amacau, Amacoao, Amaquã, Amaquan), é nome que á ilha ou península, de que se trata, se dava já em 1555 (se não antes) e não apenas mais tarde, de 1557.
Uma das cartas escriptas por Fernão Mendes Pinto, quando fazia parte da Companhia de Jesus, editadas e annotadas em 1902 em Hamburgo pelo dr. Nachod, em face do codice 49-IV-50, fl. 95 a 98, é datada de “Amacao” no mez de novembro de 1555.
Nésta carta diz o auctor da Peregrinaçam: “Mas porque hoje cheguei de Lampacau, que é o porto onde estamos, a este amaquã que é outras seis leguas mais adiante aonde achey ao padre Mestre Belchior que veio aqui de Cantam…”
De Macau e do mesmo mez e anno de 1555 são igualmente datadas duas cartas do padre jesuita Belchior Nunes Barreto; uma dirigida para Roma a Santo Ignacio de Loyola e publicada em Coimbra (em hespanhol) e em Veneza (em taliano) no anno 1565; a outra remettida para Goa aos padres e irmãos da Companhia e de que se conserva copia no codice da Real Bibliotheca da Ajuda 49-IV-49, fl. 236-237, bem como da primeira a fl. 237-241.” (3)
Neste livro, o autor analisa as três opiniões ou hipóteses que, sob o ponto de vista da determinação do ano ou dos anos em que Camões residiu em Macau: a do Visconde de Juromenha (entre 1556 a princípios de 1558), a de Wilhelm Storck (fins de Julho de 1558 aos princípios de 1560) e a do Dr. Teófilo Braga (os anos 1557, 1558 e 1559).
O livro que é anunciado na contra-capa: NO PRÉLO – «Macau-Materiais para a sua história no século XVI» foi publicado em 1988 pelo Instituto Cultural.
FREITAS, Jordão de – Macau : materiais para a sua história no século XVI. Macau: Instituto Cultural, 1988. – 43 p.
(1) FREITAS, Jordão de – Camões em Macau. Lisboa, Imprensa Libânio da Silva, 1911, 52 p. 22, 5 cm x 15,5 cm
(2) Jordão Apolinário de Freitas (1866-1946) dedicou entre 1904 a 1907, os seus estudos ao Extremo-Oriente, o Japão, a China, Luís de Camões em Macau, Fernão Mendes Pinto, a embaixada dos príncipes japoneses à Europa em 1584, etc.
Sobre este autor, uma biografia detalhada em «Elogio do Dr. Jordão de Freitas» pelo Dr. António da Silva Rego (publicado pela Academia Portuguesa da História, 1956) e disponível em:
http://arquivohistoricomadeira.blogspot.pt/2009/03/elogio-do-dr.html
Disponível também «Camões e Macau» do Padre Manuel Teixeira (onde analisa a opinião do Jordão de Freitas) em:
http://www.library.gov.mo/macreturn/DATA/PP272/index.htm
NOTA: Foi também Jordão de Freitas, então bibliotecário da Ajuda, quem deu a conhecer o manuscrito encontrado em 1911, sobre uma relação dos bens de raiz do Colégio de São Paulo de Macau, do Padre António Cardim, reitor do Colégio de Macau de 31-08-1632 a 23-05-1636. Nele, referia que existia já nessa época um local de Macau, denominado «Penedos de Camões», junto do «campo dos patanes».
(3) Artigo publicado no «Portugal», n.º 98, de 2-VI-907, e reproduzido em “O Oriente Portuguez”, vol. IV, n.º de Julho e Agosto de 1907, pp. 293-94.