Archives for posts with tag: Amoy 廈門 Xiamen

Carta “privada” escrita de Macau para publicação no «The Asiatic Journal and Monthly Register for British and Foreign India, China, and Australasia», jornal financiado pela “East India Company” (impresso em Londres). (1)

Nesse ano de 1842, “nascia” Hong Kong e a abertura de cinco portos chineses nos termos do “Tratado de Nanquim”, que seria assinado a 29 de Agosto. Pelo “Tratado de Nanquim” isentava os estrangeiros da jurisdição chinesa, em resultado do desfecho da Guerra do Ópio, seguindo-se os chamados “Tratados Desiguais”. Foi o fim da “I Guerra do Ópio”. A China pagou pesada indemnização e foram abertos ao comércio estrangeiro os cinco portos seguintes: Cantão, Amoy, Fuchau, Ningpo (Liampó) e Shanghai (2)

(1) Extraído de « The Asiatic Journal and Monthly Register for British and Foreign India, China, and Australasia », VOL XXXIX SET –DEC 1842, p. 294. Este jornal esteve em circulação quase quarenta anos de 1816 a 1845, com alteração do título: 1816-1829 – Série 1: The Asiatic Journal and Monthly Register for British India and its Dependencies; 1830-1843 – Série 2: The Asiatic Journal and Monthly Register for British and Foreign India, China, and Australasia; 1843-1845 – Série 3: The Asiatic Journal and Monthly Miscellany. https://en.wikipedia.org/wiki/The_Asiatic_Journal_and_Monthly_Register_for_British_India_and_Its_Dependencies

(2) SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau, Volume II, 2015, p. 97

“Era este o nome que os portugueses davam a Iquan, ou Cheng Chi-lung. (1)
Nasceu no distrito de Chuan-chow, aí por 1600. Aos 18 anos, veio para Macau, onde foi baptizado com o nome de Nicolau, do nome do seu padrinho, (2) que o tratou como filho.
Regressando à sua terra, partiu para o Japão, onde se colocou ao serviço dum rico comerciante chinês, Li Han, casando ali com a japonesa Tagawa (3). Sabendo português, foi para a Formosa como intérprete da Companhia Holandesa, cujo serviço abandonou em 1625 para se fazer pirata.
Quando Li Han morreu, (4) Iquan tomou conta da maior parte dos seus navios e da sua riqueza. Em breve, comandava 400 juncos que, em fins de 1627, se elevavam a mais de 1000. Apoderou-se de Amoy (5), e dali dominava toda a costa entre o rio Yantse e o rio das Pérolas.
O Imperador (Chongzhen 崇禎); vendo que o não podia vencer, nomeou-o em 1628, comandante da frota imperial com o grau de mandarim, com a condição de limpar os mares de outros piratas, o que ele aceitou, estabelecendo em Amoy o seu quartel-general.
Passando em silêncio as suas façanhas, (6) vejamos apenas o incidente que se deu com Macau.

IQUAN o pirataIlustração de Zheng Zhilong e do seu filho Coxinga
http://en.wikipedia.org/wiki/Zheng_Zhilong

Demos a palavra a Palafox:
«Julgo agora necessário dizer algo sobre a questão que se originou entre Icoan e os Portugueses de Macau. Ele mostrou sempre inclinação e apreço por esta cidade, onde viveu quando era jovem, quando nunca esperava ser elevado à categoria actual. Aconteceu agora um notável incidente que esteve para o levar (como ele ameaçou) a indispor-se fortemente com os seus habitantes.
A ocasião foi a seguinte: Achando-se no Japão no início da sua carreira teve lá uma filha natural, que foi baptizada e educada na Religião Católica. Quando os cristãos foram expulsos do Japão, ela fugiu e veio com eles para Macau, onde foi recebida por pessoas caritativas, que se incumbiram da sua pia educação no exercício da Religião Cristã.
Sendo informado de que a sua filha se achava em Macau, enviou recado aos portugueses para que lha mandassem, visto ser sua filha.
Estes sabiam que era o pai que exigia a sua filha, mas não julgaram conveniente enviar-lha; e a razão era que ela era cristã e ele, ainda que ele fora baptizado e fizera a sua profissão de fé, vivia agora como infiel e não tratava senão com infiéis. No entanto, quiseram examinar e considerar tão importante negócio. Para este fim, reuniram uma Assembleia de Eclesiásticos e de outras pessoas piedosas, os quais chegaram à conclusão de que se não devia restituir a filha ao pai.
Ao saber disto, Iquan lançou terríveis ameaças, de que viria e cercaria Macau com uma esquadra de 500 a 1.000 navios, que levaria a sua filha pela força, arruinaria ou extirparia todos aqueles que haviam detido a sua filha, e que desde este momento ele começaria a reduzi-los à extremidade da indigência e da necessidade, pondo final à recepção de quaisquer provisões ou comodidades da China.
Apesar de todas estas ameaças, (7) não lhe entregaram a filha, nem permitiu Deus que ele fizesse cair a cidade os flagelos que meditara».
Esta filha devia ser uma que casara em Macau com um português (ou macaense) chamado António Rodrigues, filho dum cidadão chamado Manuel Belo; ambos eles foram viver com Iquan em Anhai aí por 1640; o último acompanhou-o a Pequim em 1646, voltando depois para Anhai, onde faleceu em 1649.
Iquan tinha 300 negros ao seu serviço, sendo todos cristãos e escravos fugidos de Macau. Quando foi preso traiçoeiramente (8) pelos manchus em Amoy, os escravos opuseram forte resistência, sendo mortos uns 100 no combate. Os restantes colocaram-se ao serviço dos manchus em Cantão, onde muito se distinguiram no cerco de 1647.
O seu grito de guerra era Santiago.” (9)

(1) 鄭芝龍 Zheng Zhilong ou Cheng Chi-lung, baptizado com o nome de Nicolau Iquan Gaspar nasceu em 1604, no distrito de Chuan chow, provavelmente na cidade de Nan’an (Fujian), 820 milhas ao norte de Amoi/Xiamen.
(2) Nicolau Gaspar (???), português respeitável e rico que lhe deixou larga porção da sua herança pois morreu sem descendência. (10)
(3) Tagawa Matsu (田川松), ou Weng-shi (翁氏) (1601 – 1646). O filho de Iquan e Tagawa, nascido em Hirado (Japão), Zheng Chenggong (鄭成功 – em pinyin: Guóxìngyé (1624-1662), recebeu do príncipe de Tang, de nome Lung Wu (imperador Ming), o título de Kuohsing-yeh   (“Senhor do Apelido Imperial”), que os portugueses chamaram de Koxinga ou Coxinga. Como os Tártaros-Manchus não tinham esquadra, Lung Wu estava seguro sob a protecção de Iquan e do filho Coxinga; mas, querendo internar-se no interior, foi derrotado em Tingchow (Tingzhou) ; fugiu e morreu no cativeiro. (10)

Zheng Cheng gong Estátua de Zheng Chenggong em Xiamen, Fujian.
http://en.wikipedia.org/wiki/Koxinga

(4) Li Han e Iquan haviam favorecido em 1624 a transferência dos Holandeses dos Pescadores para a Formosa e estimularam a emigração dos Chineses para esta ilha.
(5) Amoy 廈門 Xiamen

Hans PutmansHans Putmans
http://thisdayinalternatehistory.blogspot.pt/2010_10_01_archive.HTML

 (6) Em 11 de Julho de 1633, uma esquadra holandesa sob o comando de Hans Putmans chegou a Amoi e, dois dias depois, atacou traiçoeiramente a frota imperial sob o comando de Iquan, destruindo-a completamente dentro de poucas horas. Iquan organizou em breve uma nova esquadra de 100 navios e, aos 22 de Outubro atacou a de Putmans e, depois de afundar o navio Brouckerhaven e de capturar o Sloterdijck, obrigou os Holandeses a levantar o cerco de Amoi. Tendo perdido outros 2 navios num tufão, Putmans retirou-se para os Pescadores e Formosa. (10)
(7) Pelo contrário, mostrou-se amigo dos Portugueses e auxiliou-os no seu comércio com o Japão, levando lá nos seus próprios barcos as mercadorias de Macau. (10)
(8) Os Tártaros-Manchus prometeram então a Iquan nomeá-lo vice-rei das três províncias de Chekiang, Kwangtung e Fukien, se ele se submetesse, o que ele fez. Em 1646, o general manchu Tung Kuo-chi induziu-o a descer a terra, e quando o apanhou, traíu-o e “convidou-o” a seguir para Pequim. Pretendendo os Manchus obter a submissão da sua esquadra e dos seus sequazes, sobretudo do seu filho Coxinga, trataram-no como um príncipe; mas o filho rejeitou todas as ofertas e colocou-se ao lado do último pretendente ming, o príncipe de Kwei, mais conhecido por imperador Yung Li. Em 1648, os padres Gabriel de Magalhães e Luís Buglio foram levados de Szechevan a Pequim; Iquan visitava-os amiúde, construiu-lhes uma casa e capela, proveu-os de dinheiro, criados e alfaias.
Nem as promessas nem as ameaças dos Manchus puderam seduzir Coxinga, que em 1656 atacou Nanquim e em 1660 alcançou uma brilhante vitória naval em frente de Amoi. Os Manchus acusaram então Iquan de encorajar secretamente o filho e privaram-no de todas as honras. Reduzido à miséria, viu-se forçado a aceitar as esmolas dos Jesuítas, a quem antes favorecera. Aí por 1661, foi condenado à morte e degolado.(10)
(9) TEIXEIRA, Padre Manuel – Iquan, o pirata maroto in Vultos Marcantes em Macau.
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2015/05/31/leitura-vultos-marcantes-em-macau/
(10) http://www.library.gov.mo/macreturn/DATA/PP280/PP280266.HTM