Nasceu a 12 de Maio de 1806, em Macau, João Francisco Rodrigues Gonçalves (1806-1870), descendente da família Cortela.(1)
Desde muito novo se dedicou ao estudo da língua chinesa, (2) vindo a ser um abalizado sinólogo. Era amicíssimo do Governador João Maria Ferreira do Amaral e um dos melhores colaboradores dos eu governo, sendo o tradutor de todos os documentos oficiais nas relações com os chineses. (3) O Governador Ferreira do Amaral costumava sair com ele a passeio e à tarde era frequente ver os dois a cavalo pelas ruas da cidade.(4)
Após a morte do governador continuou a prestar serviços a esta Província como intérprete da Procuratura dos Negócios Sínicos.
João F. Rodrigues Guimarães foi nomeado membro da missão diplomática (5) que , em 1862, se deslocou a Tien-Tsin (天津 – Tientsin) a fim de firmar o célebre tratado de 54 artigos, pelo qual a China reconheceu Macau com Colónia Portuguesa. Presidia a esta missão diplomática o Conselheiro Isidoro Francisco Guimarães, (6) então Governador que mercê do sucesso obtido foi agraciado com o título de Visconde da Praia Grande.
Em reconhecimento da valiosa colaboração prestada como intérprete e que muito contribuiu para este sucesso , foi também agraciado pelo Governo de Sua Majestade com o grau de Oficial da Ordem de Torre e Espada, por Decreto de 22 de Junho de 1863, do Ministério do Reino.(7)
João Rodrigues Gonçalves foi ainda outra vez a Pequim, em 1860), como intérprete da embaixada francesa de Mons. de Bourboulon, ministro plenipotenciário francês.
Em recompensa também por outros serviços pelo zelo e dedicação sempre brilhantemente demonstrados, foi ainda agraciado com as Comendas da Conceição e da Ordem de Cristo.
Faleceu a 18 de Outubro de 1870 amargurado de desgostos, vítima de injúrias e traições (8) mas mais tarde a Justiça soube desfazer, dando jus ao seu nome e à sua acção.
Os seus amigos levantaram-lhe no cemitério de S. Miguel onde foi sepultado, um mausoléu e bem digno dele, no qual foram gravadas estas palavras: «Bem-aventurado tu que sofreste injustiças, porque grande será o teu galardão no céu».(9)
(1) A sua avó materna, Antónia Baptista Cortela, nascida em Macau, em 13 de Agosto de 1715, era filha de Lourenço Baptista Cortela e de Esmeralda Soares e neta paterna de João Baptista Cortela e de Coleta de Sousa.(10)
(2) Teve como mestre o Padre António Afonso Gonçalves no Colégio de S. José.(10)
(3) Nomeadamente toda a correspondência após a morte do governador Ferreira do Amaral com as autoridades de Heong Sán e Cantão (publicadas no Boletim Oficial de 1849-1850) até à devolução da cabeça e da mão de Ferreira do Amaral.(10)
(4) Esta amizade e dedicação acarretou-lhe o ódio dos chineses, que segundo consta, chegaram a pôr a sua cabeça a prémio, oferecendo $ 10.000 a quem assassinasse o Governador e $ 5.000 a quem assassinasse o intérprete da língua chinesa, João Rodrigues Gonçalves. Por ocaso, no dia em que o governador Amaral foi assassinado, João Rodrigues Gonçalves não o pode acompanhar, devido ao seus trabalhos oficiais.(10)
(5) João Rodrigues Gonçalves nomeado intérprete por Portaria n.º 20 de 19 de Abril de 1862.(10)
(6) Conselheiro Isidoro Francisco Guimarães, governador de Macau de 1851 a 1863. A Missão diplomática partiu de Macau em 23 de Abril de 1862, chegando a Xangai a 3 de Maio e a Tien-Tsin a 26 do mesmo mês. O Tratado de Tien-Tsin (天津 条约 – Tratado de Tianjin) foi assinado a 13 de Agosto. Regressou a Macau em 9 de Setembro.(10)
(7) Portaria n.º 48, publicada no Boletim do Governo de Macau, n.º 41 de 14 de Setembro de 1863.(10)
(8) Mesquinhas questões suscitadas por António Feliciano Marques Pereira (secretário da missão diplomática ao Tratado de Tien-Tsin) que era Procurador dos Negócios Sínicos, o redactor do «Echo do Povo», e João Rodrigues Gonçalves, 1.º intérprete da Procuratura, veio este a ser suspenso do seu cargo pela Portaria n.º 55 de 8 de Maio de 1869 e demitido de 1.º intérprete da língua chinesa por Decreto Régio de 3 de Outubro de 1869.(10)
(9) Informações de «Macau B. I. 1954»
(10) TEIXEIRA, P. Manuel – Galeria de Macaenses Ilustres do Século XIX, 1942.