O jornal “Echo do Povo” no seu n.º 68 de 15-07-1860 clamava o seguinte:
“Mandam para Africa umas 50 mil patacas tiradas da caixa pública de Macau; empregam uma 25 mil patacas para edificar um palácio para o governador (1) e falla-se já em gastar mais de 50 mil para construir um novo quartel (2), e não querem gastar nem um real para a instrução da colónia, donde procede todo esses dinheiros!!! — Esta injustiça clama aos céos”.
Em 24 de Março de 1861, o mesmo jornal voltava a debruçar no “lastimoso estado em que se acha a instrucção publica em Macao”.
E acrescentava:
“ As cincoenta mil patacas que mandaram para Angola, não eram mais que bastantes para dotar um collegio (havendo já edifício adequado para tal fim) tal qual Macao precisa? Extranhamos por certo a apathia e o indesculpável desleixo de S. exa. O Sr. Governador Guimarães e de dois seus antecessores, o sr Adrião e o sr Pegado, em cujo tempo a caixa publica tinha para dispender. A esses senhores cabe toda a responsabilidade do estado de embrutecimento, em que se acham hoje os mancebos de Macao. Temos vitos filhos de pessoas de alta classe da sociedade, vadiando, ou quando muito, tornarem-se locheiros, soldados de policia, chuchaeiros (3) e abraçarem as cupações ruins d´esta classe, por falta de prestimo (causada pela falta de ensino) para ocupar cargos honrosos”.
Finalmente por iniciativa particular, o capitalista macaense Visconde do Cercal (então Barão do Cercal) resolveu promover meios para fundar uma escola. Para esse fim fez correr uma circular com data de 15 de Fevereiro de 1861, em que expunha o plano da projectada escola, solicitando ao mesmo tempo a coadjuvação pecuniária do público. Conseguiu-se em poucos meses obter um capital de mais de vinte mil patacas, e, em pouco tempo, foram mandados vir de Portugal dos professores das línguas portuguesa, francesa e latina e de Inglaterra um professor Inglês (“um bom mestre da língua inglesa, que é mesmo tempo da religião católica e natural de Londres”) (4)
A escola “Nova Escola Macaense” foi inaugurada no dia 5 de Janeiro de 1862, à 1 hora da tarde, nas “cazas de Escola, na Rua Central, – vasto edifício muito acertadamente escolhido”. A cerimónia constou de um pequeno discurso lido pelo secretário da Comissão Directora da Escola, António Marques Pereira, (5) por parte da mesma Comissão; de uma larga oração, também lida, pelo Padre António Vasconcellos, professor da Escola; (6) e de uma falado Juiz de Direito de Macau, findo o que o Barão do Cercal declarou inaugurada a Escola. Terminada a cerimónia, deu o Barão de Cercal um lauto almoço, durante o qual a banda do batalhão de linha tocou escolhidas peças de música. Assistiram a esta festa, o governador, algumas senhoras e muitos funcionários e principais cavalheiros de Macau.
(Boletim do Governo de Macau, Anno VIII, n.º 6, 1862)
Mas a Escola foi de curta duração pois a 21 de Outubro de 1867, era encerrada. A 29 de Setembro de 1867 reuniram-se os subscritores desta escola para deliberar sobre a aplicação a dar ao dinheiro, visto que em 21, mês seguinte expirava o contrato feito por 5 anos com os professores da mesma. (7)
Retirado de TEIXEIRA, Padre Manuel – A Educação em Macau, 1982.
(1) O antigo Palácio do Governo na Praia Grande foi construído por Isidoro Francisco Guimarães, Visconde da Praia Grande e Governador de Macau (1851-1863).
(2) Foi José Rodrigues Coelho do Amaral, Governador de Macau (1863-1866), que executou esse plano: em 1864 mandou demolir o convento e a igreja de S. Francisco para construir ali o Quartel de S. Francisco.
(3) Chuchaeiros = porqueiros. Do chinês (cantonense) “chu-chai”, 豬仔 – pequeno suíno, isto é leitão, (segundo Padre M. Teixeira na obra consultada). Mas poderá ser também referente ao trabalhador ou “cule” chinês, antigamente embarcado, teoricamente sob contrato, de Macau, Hong K).ng e outros portos do Sul da China, para a América Central, mormente Cuba, e outras terras distantes (BATALHA, Graciete – Glossário do Dialecto Macaense, 1977.
(4) Terá sido o inglês Arthur R. Montgomery que em 1867, no mesmo dia do encerramento da escola, em 21 de Outubro de 1867, colocou um anúncio no «Boletim da Província de Macau e Timor», XII-n.º 42 : “informar ao publico de Macau que elle se acha prompto a dar lições em cazas particulares, ou em sua própria residência, em qualquer hora que fossem convenientes”
(5) O discurso foi publicado no Boletim do Governo de Macau, VIII n.º 6, 1862.
(6) O discurso do Padre Vasconcelos foi publicado no Boletim do Governo de Macau, nos n.ºs 7 e 8 do ano VIII.
O Pe António Augusto Maria de Vasconcelos veio para Macau em 1862 como professor da Escola Macaense, Foi dado o seu nome a uma rampa existente na Guia, um pouco além do início da Estrada de Cacilhas, “Rampa do Padre Vasconcelos”.
Ver anterior referência em
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/rampa-do-padre-vasconcelos/
(7) O capital remanescente dos fundos da “Nova Escola Macaense” na importância de $ 9 417,53 foi entregue por Alexandrino António de Melo à Associação Promotora da Instrução dos Macaenses para a fundação de um colégio para instrução dos macaenses – Collegio Comercial – e que viria depois a ser denominado “Escola Comercial”.
[…] Os Estatutos da APIM foram aprovados por Portaria Provincial n.º 51 de 29-09-1871 do governador António Sérgio de Sousa e publicados no «Boletim da Província de Macao e Timor» de 2-10-1871. Tinha 15 artigos sendo de salientar: Art. 2.º. O fim da associação era fundar e manter sob a denominação de “Collegio Comercial”, uma casa de educação e de instrução …. Art. 3.º. (…) … O capital proveniente de 40 acções de $ 500 cada uma… Art. 4.º. O valor das acções poderá ser pago imediatamente, ou em 5 soluções anuais de $ 100, pagáveis no começo do ano. A comissão administrativa com a data de 02-10-1871 publicava um anúncio no «Boletim da Província de Maca0 e Timor» XVII-42 de 16 de Outubro, convidando o público a subscrever as acções desta Associação. Os sócios accionistas foram 31 que entraram com a prestação de cem patacas: alguns pagaram por uma vez a quantia total, outros, em prestações anuais durante 5 anos. O total da quantia dos accionistas fundadores totalizou $11 000. Juntou-se a esse capital o remanescente dos fundos da “Nova Escola Macaense”, entregue por Alexandrino António de Melo, Visconde do Cercal, na importância de $ 9 417,53. (3) A Escola Comercial (depois denominada Escola Comercial “Pedro Nolasco”, por este, Pedro Nolasco da Silva, ter sido a alma do empreendimento e seu grande dinamizador) começou a funcionar no dia 8 de Janeiro de 1878 sob a chefia de João Eleutério d’Almeida, numa casa particular. A lista dos primeiros professores: José Vicente de Jesus – classe elementar de Português, Geografia, História, Aritmética, Álgebra. Escrituração Comercial e Catecismo. Theodosio Rodrigues – classe superior de Português, História e Geografia, classe inferior e superior de Ingês. João de Lycopolis de Faria Marçal – língua chinesa. Ly Langshan – língua chinesa. Câncio Jorge – caligrafia. Dr. Bernardo Maria das Neves d´Araújo Roza – prelecções sobre rudimentos de ciências naturais (duas vezes por semana) O edifício situado no alto da Calçada do Gamboa, na Praça do Gamboa n.º 2, construído em 1920, foi sede da Escola Comercial até o ano 1966, ano da inauguração do edifício (actual Escola Portuguesa) no cruzamento das Avenidas D. João IV e do Infante D. Henrique (projecto de arquitectura de Raul Chorão Ramalho e executado pelo construtor civil Osseo Acconci) Outras referências à Escola Comercial https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/escola-comercial/ (1) Acta da instalação da associação promotora da instrução dos macaenses: Aos 17 de Setembro de 1871, em Macau, e na residência do cidadão Maximiano António dos Remedios, senior, estando reunidos os abaixo assignados, se resolveu por unanimidade instalar a “Associação Promotora da Instrução dos Macaenses”, cujos estatutos foram n´este acto lidos, discutidos, e aprovados; e tendo-se procedido à eleição da comissão administrativa, foram eleitos por aclamação os seguintes cavalheiros: Maximiano António dos Remedios, senior, presidente João Joaquim Braga, tesoureiro Pedro Nolasco da silva, junior, secretário Lourenço Marques, vogal Vicente de Paulo Portaria, vogal António Manuel Pereira, vogal Filomeno Maria da Graça, vogal Além dos eleitos assinaram esta data: Joaquim Braga, Domingos Clemente Pacheco, José Homem de Carvalho, José Elleuterio d´Almeida, Antonio dos Remedios, José A. dos Remedios, Albino António da Silva, Miguel Aires da Silva e Maximiano Antonio dos Remedios, junior. De salientar que do grupo fundador da Associação, estavam representados os comerciantes portugueses de Hong Kong nomeadamente Maximiano Antonio dos Remedios, João Joaquim Braga, Filomeno Maria da Graça e os capitalistas de Macau, Lourenço Marques, António Manuel Pereira e Vicente de Paulo Portaria. Entre os membros fundadores há quatro da família Remédios: o 1.º presidente da APIM, Maximiano António dos Remédios (12-09-1808/ 1-02-1875) e os seus três filhos: António dos Remédios (14-11-1839), José António dos Remédios (19-03-1842) e Maximiano, júnior (26-05-1872). Só a família Remédios contribuiu com a quantia de $1400 patacas. (António -$200; José – $500; Maximiano senior- $400; Maximiano Junior- $300. Por isso o Padre Teixeira ( ) refere o seguinte: “Concordamos inteiramente com esta palavras tão justas ( elogio e gratidão ao benemérito Maximiano António d Remédios por essa iniciativa por parte de Leôncio Ferreira num jornal local) ; mas o facto é que o nome de Maximiano dos Remédios foi totalmente obliterado e hoje só é lembrado o do secretário, (na altura, um jovem) Pedro Nolasco da Silva. Pois bem, não há hoje nada que recorde o seu nome , sendo salientados outros que ficam muito aquém destes. Esperamos que a Associação venha a reparar esta ingratidão” TEIXEIRA, Padre Manuel – A Educação em Macau, 1981 (2) Francisco da Silva Magalhães insinuou no seu jornal “O Oriente” que na projectada organização da escola comercial, a APIM não tinha em vista a instrução, mas fim um fim oculto e um motivo meramente político, nomeadamente o pretexto para chamarem de volta a Macau os jesuítas. A APIM reagiu publicando um anúncio no «Boletim do Governo de Macau e Timor» XVIII- 10, 1872, em forma de “PROTESTO”: (3) Alguns cavalheiros opuseram-se à transferência das quotas dos remanescentes da “Nova Escola Macaense” para a nova associação. Ver anterior referência à «Nova Escola Macaense» em; https://nenotavaiconta.wordpress.com/2018/01/05/noticia-de-5-de-janeiro-de-1862-nova-escola-macaense… […]