Os dois caracteres vermelhos “Tái Ut” – 太乙 (1) num dos rochedos do Templo da Barra.
Foto pessoal – 3 de Agosto de 2005
A lenda associada aos dois grandes caracteres vermelhos – Tái Ut – que se encontram numa rocha do Templo da Barra e que remonta ao tempo do estabelecimento dos portugueses em Macau, é -nos contada por Luís Gonzaga Gomes(2).
“Nesse tempo, lorchas carregadas de mercadorias e provenientes de todos os portos da China fundeavam no porto interior, junto ao templo de T’in Hau, a Soberana do Céu, protectora das gentes do mar, de quem eram extremamente devotos.
Curioso, porém, é que apesar desse fervor religioso, dir-se-ia que os navegantes se encontravam em desfavor da sua patrona, pois todos os anos, nas proximidades do dia 23 da 3ª lua, dia consagrado à festividade da T’in Háu, não deixava de se dar um estranho naufrágio, em frente do seu templo. Tal facto, atribuíam à ausência de T’in Háu, (3) que nessa ocasião visitava a sua terra natal, Tin-Pou, em Fuquiem.(4)
Houve um ano, porém, que aportaram todas as embarcações excepto uma, a de Mâk Kâm Tái, que, por andar atarefado, não conseguira chegar a tempo para as festividades de T’in Háu. Porém, para os lados das Nove Ilhas, formou-se uma nuvem negra que, absorvendo as águas do mar e formando uma coluna de água, envolveu a embarcação de Mâk Kâm Tái, desfez-la em mil pedaços que se esfrangalharam de encontro à superfície do mar. Apesar do desastre ter ocorrido em frente do templo, onde se encontravam centenas de embarcações, estas nada sofreram e ninguém se apercebeu da tragédia. Apenas dois tripulantes se salvaram, testemunhas de tão terrível tragédia. Como tal calamidade ocorria periodicamente e todos os anos, por essa data, destroços de naufrágios apareciam em frente ao templo, cresceu o culto dos marítimos à deusa.”
POSTAL – “Temple of the goddess A-Ma (the name of Macau derived from)” – 1986
Copyright Dept. of Tourism (D.S.T.) MACAU – 86-12
Impresso na Gráfica de Macau Lda.
“……..Ora vivia nesse tempo um geomante aureolado de grande fama, pois estava mais que comprovada a infalibilidade das suas pronunciações. Não havia cidade, povoação ou aldeia na província de Kuóng-Tông (5) onde o nome desse têi-lei-sing-sâng (geomante) não fosse referido com o maior respeito.
Chamava-se Lái-Pôu-I e aconteceu ter vindo nessa época a Macau. Um dia resolveu ir visitar o Templo da Barra. Achou o sítio encantador e quedou-se meditando, durante algum tempo, em frente dos admiráveis conceitos inscritos na áspera superfície de vários rochedos. Quando chegou diante duma enorme fraga, para comprazer os que o acompanhavam, pôs a estudar o local com a sua ló-p´ún (a bússola dos geomantes) junto de uma enorme rocha. Depois de apalpar o lóng mak (o pulso do dragão), segundo as regras da ciência de que era senhor. Ao cabo de algum tempo, voltou-se para os circunstantes e disse-lhes suspirando:
– Não há dúvida. É exactamente aqui neste sítio onde a virulência do ar nocivo é mais acentuada.
Contaram-lhe dos naufrágios, que todos os anos ocorriam mesmo em frente do templo. Disse, então, Lái Pou I, que era preciso contrapor, quanto antes, a influência do ar nocivo, pois «a corrente da Ribeira Grande, na fronteira ilha da Lapa, entra na porção do rio que fica em frente ao templo, escavando, no seu ímpeto, o leito, de forma a moldá-lo numa larga e profunda bacia semelhante a uma rede de pesca. Por sua vez, a Ribeira Grande age como um pescador, que ao lançar a sua rede colhe, todos os anos, uma embarcação». Foram estas as palavras do famoso geomante. Os marítimos, por sua vez, trataram de angariar uma larga soma para pagar a Lái Pou I por forma a que este acabasse de vez com tal nefasta influência.
Lái Pou I traçou na rocha os dois grandes caracteres vermelhos – Tái Ut – que significam causa primordial, a frase tauista que impede qualquer tipo de desgraça. Depois, debaixo da rocha, enterrou uma espada com o gume voltado para a Ribeira Grande, para cortar as cordas da nefasta rede. «Desta forma, o pescador, criado pela fértil imaginação do geomante, ficou inibido de puxar a sua malfazeja rede e, por tal facto, daí em diante, nunca mais se registou a ocorrência de naufrágios misteriosos em frente do templo da Barra».”
POSTAL – Templo de A-Ma – Famoso Rochedo/A view of the A-Ma Temple – Famous Rock/媽閣廟 – 名巖 (6) – S/ data, provável da década de 90
Direcção dos Serviços de Turismo de Macau
Lito: Imprensa Nacional de Macau
(1) 太乙- mandarim pinyin: tài yǐ; cantonense jyutping: taai3 jyut3.
(2) GOMES, Luís Gonzaga – A Rocha de “Tái Ut” do Templo da Barra, in Macau Factos e Lendas, ICM, 1994.
(3) 天后 – mandarim pinyin: tiān hòu; cantonense jyutping: tin1 hau6. Deusa do mar/imperatriz do céu, também conhecida por Mazu – 媽祖; Local de nascimento Meizhou (湄州) em Putian (莆田縣), Província de Fujian.
(4) 福建 -Fujian, Fukien, Fuquiém ou Hokkien.
(5) 廣東 – Guangdong, Kuangtung ou província de Cantão.
(6) 名巖 – mandarim pinyin: ming yán; cantonense jyutping: meng 4 ngaam4.
[…] (1) LOPES, Fernando Sales – Pescador de Margem. Livros do Oriente, 1997 Sobre o geomante Lái Pôu I e a rocha “Tái Ut / 太乙”, existente nos jardins do Templo da Barra/ Á Má, ver anterior referência em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/2015/08/11/leitura-a-rocha-tai-ut-do-templo-da-barra/ […]