Do álbum da colecção Duarte de Sousa, reproduz-se outro desenho a lápis de Macau, (do livro: “Macau, Cidade do Nome de Deus na China”), sem nome do autor, referenciados como do ano de 1831-1832. (1)
“The Barrier. Macao, on the Race Course. The Cecilia Bay.”
O istmo que ligava Macau à terra chinesa, a chamada Porta do Limite ou da Barreira. O campo de corridas de cavalos mantido pelos ingleses, com apostas que atraía muita gente. À direita, a baía/praia da Areia Preta que vem referenciada como Baía Cecília. Nunca vi referenciada esta baía/praia com este nome. Terá sido o autor induzido em erro por esta praia/baía estar em continuidade com a praia de Cacilhas?
Sobre esta região escreveu J. Dyer Ball (2), em 1905, no capítulo “The Barrier”:
“This is the division between Portuguese, and Chinese territory. It is some distance along the long isthmus which unites the peninsula of Macao to China… (…)
Just before reaching the Barrier a short distance is the bathing place, the whole coast line here forming with the sandy beach on the seaward side a magnificent roughly semi-circular bay. Many large fishing stakes are seen with the hovels of their owners perched up amongst the rocks. The whole of Macao seems dominated by forts. To the left is a large one, topping a hill, commanding the Barrier, while to the left are two small ones overlooking the sea and Cacilha’s Bay. Once on the road, leading to the Barrier, we see facing us the large gateway which marks the boundary line…”
Sobre o “hipódromo” e as corridas de cavalo na Areia Preta, uma descrição com algum pormenor de Harriet Low (3) que viveu em Macau de 1829 a 1834, no seu Diário:
5 de Novembro de 1829: – “…O campo de corridas está no lugar chamado a Barreira, que impede todos os estrangeiros de passarem além. O campo mede cerca de três quartos de milha. Havia lá uma casa provisória de bambú construída para as senhoras, e posso afiançar-te, minha querida irmã, que era muito interessante comtemplar o matizado grupo abaixo de nós. Chineses de todas as descrições, enfarpelados nos seus trajos muito singulares, alguns com os chapéus da forma dum cesto, muitos de cabeça descoberta, mas empunhando uma ventoínha que os protege do sol. Alguns tinham sacos nas costas medindo cerca de meia jarda quadrada, nos quais metem os bebés. Estes pobrezinhos apanhavam chocadelas em toda a roda, no meio da multidão, como se fossem pedaços de madeira.
Portugueses e lascares andavam de mistura com chineses e, ao ouvir esta mistura de línguas – das quais nada comprendi, fez-me pensar na confusão de Babel, o que me levou a desejar que esta doida gente visesse na terra tamto tempo quanto lhe fosse permitido.
Algumas das corridas foram muito boas e fizeram-se grandes apostas.
Regressámos cerca das sete horas e tivemos uma longa discussão sobre os méritos dos ingleses…” (4)
“Near the Race Course. Macao”
Creio que é a mesma “paisagem” do anterior mas “vista” de mais longe, podendo distinguir melhor o istmo que ligava Macau à terra chinesa. A colina à esquerda, muito provavelmente, a de Mong Há.
Ainda sobre estas corridas de cavalos, há um ofício, de 28 de Abril de 1829, do Mandarim de Heong San ao Procurador da Cidade:
“ordenando-lhe que proibisse imediatamente as corridas de cavalos com que, por divertimento, os estrangeiros residentes em Macau (ingleses) assustavam os viandantes, junto às Portas do Limite, o que constituía uma grave ofensa às leis do Império” (5)
Em 1831 havia ainda a disputa/jurisdição sobre a posse de terras. Sobre umas obras na Ilha Verde, o Mandarim de Heong San, num ofício de 21 de Julho de 1831, informava:
“... Os portugueses só têm residência autorizada dentro das muralhas. A Ilha Verde está fora delas, no mar, à distância de alguns lis; por isso não é portuguesa …etc”. (5)
NOTA: outra referência ao Hipodromo da Areia Preta em 1934:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/hipodromo/
(1) Ver referências em anterior “post”:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2014/02/21/pintura-de-macau-de-1831-1832-i-fortaleza-da-guia/
(2) Sobre este autor e referência ao livro, ver:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/j-dyer-ball/
(3) Sobre Harriet Low, ver referência em:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/2012/09/23/leitura-diario-de-harriet-low-tufao-de-1831/
(4) TEIXEIRA, Padre Manuel – Macau no séc. XIX visto por uma jovem americana. Direcção dos Serviços de Educação e Cultura, Macu , 1981, 59 p.
(5) SILVA, Beatriz Basto da – Cronologia da História de Macau Século XIX, Volume 3. Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, Macau, 1995, 467 p (ISBN 972-8091-10-9)