“ Nesta cidade de Macau, é o jardim da Gruta de Camões o sítio que mais atrai a atenção dos forasteiros, já pelo próprio encanto da sua beleza natural, já pelo respeito que a sua venerável tradição infunde.
Encontram-se neste formoso recinto as mais variadas espécies de vegetação tropical as quais, desenvolvendo-se pujantes de selva, transformaram o jardim em local aprazivelmente umbroso, onde os raios do ardente Sol raras vezes conseguem penetrar através da densa ramaria dos seus vetustos arvoredos.
Pois, não obstante ser um dos poucos jardins públicos que existem nesta colónia, não é ele senão frequentado por chineses que, obrigados a viver em exíguas e escuras mansardas onde é desconhecida toda a espécie de conforto, se refugiam ali, durante os dias de asfixiante calor, em procura de um bocadinho de ar fresco.
E assim, dispersos por diversos mirantinhos, que estão ligados entre si por um complexo labirinto de apertados arruamentos cobertos de limugem que sobem, descem e se encurvam em espreguiçadas rampas, ou se entretêm no jogo de xadrez ou se deixam encobrir por capitosa fragância que dimana de mil e uma variedades de flores e de plantas que ali proliferam com exultadora exuberância.
Aqui e acolá, em cuidados terraplenos, deparam-se homens de meia idade que procuram o ambiente paradisiacal deste jardim para se desancilosarem , exercitando-se na ginástica de luta chinesa. Completamente impassíveis, sem se importarem com o ridículo das suas exibições, concentram-se ali, ensaiando os seus magistrais golpes contra imaginários adversários, ora lançando-se a fundo para tentar um bote mortal, ora recuando e girando dextramente sobre os seus calcanhares simulando um defesa, em movimentos sacudidos e coordenados sob o ritmo cadenciado das suas respirações.
Acorrem também ao local pacatos burgueses, com as suas enormes gaiolas de pássaros que dependuram nos ramos das árvores a fim de que os alados cantores, inspirados por aquele portentoso ambiente, possam soltar com frenesim os seus maviosos gorjeios e complicados trinados que são a delícia estética dos seus donos, que perdem horas esquecidas, parranamente embevecidos ante os seus incompreensíveis cantares.”……..
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(1) GOMES, Luís Gonzaga – Curiosidades de Macau Antiga. Instituto Cultural de Macau, 2.ª edição, 1996, 184 p., ISBN -972-35-0220-8
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