Precisamente hoje, dia do pai, dia de S. José, início do pontificado do Papa Francisco – 19 de Março, aconteceu uma tragédia em Macau no ano de 1880: o herói de Passaleão (1) , o coronel Vicente Nicolau de Mesquita depois de ter assassinado quase toda a sua família, num acesso de loucura, suicidou-se, lançando-se num poço da sua residência. (2)
Narração de uma testemunha, que foi a primeira a entrar em casa de Mesquita, aí pelas duas horas da madrugada do dia 20 de Março de 1880, pouco depois da tragédia: (3)
“À uma hora da madrugada de 20, batia à porta do coronel Garcia e ajudante de campo do Sr. Graça, (4) ordenando-lhe, da parte deste, que fosse sem demora prender o coronel Mesquita que estava doido e queria assassinar a família.
O coronel Garcia correu a casa de Mesquita não só para cumprir a ordem do governador, mas ainda como comandante do corpo da guarda policial, encontrando, quando ali chegou, todas as autoridades judiciais e administrativas, bem como força armada, mas nãos e haviam adoptado quaisquer providências.
O coronel Garcia, informado de que Mesquita havia trucidado a família, ordenou imediatamente ao capitão Porfírio de Sousa, que mandasse trazer machados da segunda divisão policial por ser a mais próxima, e em pouco tempo foi arrombada a porta principal, apesar da resistência e boa madeira de que era construída.
Não havia uma só luz; não obstante, o coronel Garcia acendendo fósforos entrou seguido por várias pessoas presentes e alguns soldados de machado; quando subiam a escada principal apareceu o tenente Brito, com uma vela acesa que serviu de grande auxílio. No tope da escada havia um lampião que mostrava não ter servido naquela noite, porque a torcida sendo nova não tinha vestígios de queimada; acendeu-se portanto esta luz que tão necessária se tornava enquanto os soldados trabalhavam no arrombamento das portas que davam ingresso para o interior de casa. Ao mesmo tempo apareceu um soldado com um lampião tirado da iluminação pública, que muito serviu para as primeiras investigações, porque tudo era trevas. Entrou-se pois na primeira casa e desde logo se convenceram todos de que uma grande luta havia tido lugar. Roupas espalhadas e atiradas ao acaso, cadeiras fora do seu lugar, aqui pratos quebrados, acolá vidros no mesmo estado; tudo fez compreender que o espectáculo de que iam ser testemunhas era horroroso.
À entrada, no segundo quarto, deparou-se logo com o cadáver todo ensanguentado da esposa que, com a cabeça atravessada com algumas balas, caíra, de costas, próximo da cama; enquanto se fazia esse exame, ouviu-se no mesmo quarto um fraco gemido; todas as atenções se dirigiram para aquele ponto. Era a filha mais velha que estava ferida, sendo o ferimento mais grave na cabeça. Interrogada disse, que sentindo-se desfalecer com uma pancada, que com a arma seu pai lhe dera na cabeça, caíra no chão no momento em que se apagara a luz, e que arrastando-se até à sua cama ali se escondera fechando as cortinas, e que perdendo completamente os sentidos depois de estar na cama, só os recuperara com as pancadas dadas nas portas quando as arrombavam.
Não lhe fizeram mais perguntas, porque a perda de sangue, que acabava de sofrer, a tinha posto em tanta fraqueza, que a muito custo se podia perceber o que dizia, e como estava presente o facultativo da guarda policial, Bernardo Araújo da Rosa, por ele foram prestados os primeiros socorros. Em acto contínuo, pediu-se a uma senhoras que moravam próximo, para acompanharem a enferma até poder ser conduzida ao hospital, o que fizeram por humanidade, apesar do susto com que estavam.
Prosseguiram-se as investigações até à última casa onde foi encontrada a filha mais nova debaixo duma mesa que estava a um canto da casa e próxima ao alçapão que dava comunicação com os gudões e mais serventia da casa.
……………………………………..continua no próximo “post”.
(1) Na sequência do assassinado do Governador João Ferreira do Amaral no dia 22 de Agosto de 1849, as tropas chinesas concentraram-se no forte de Pak- Shan-Lan ou Baishaling (em português Passaleão), perto das Portas do Cerco. No dia 25 de Agosto de 1849, o então segundo-tenente Mesquita, com apenas 16 homens da sua confiança e mais alguns voluntários paizanos, conseguiram tomar o Forte onde estavam 400 soldados e 20 peças de artilharia de calibre 18.
(2) GOMES, Luís G. – Efemérides da História de Macau. Notícias de Macau, 1954, 267 p.
(3) TEIXEIRA, P.e Manuel – Vicente Nicolau de Mesquita. Macau, 2.ª edição, 1958, 98 p.
(4) Trata-se do Governador Joaquim Joze da Graça (governou de 28-11-1879 até à tomada de posse de Thomaz de Sousa Roza em 23-04-1883). O ajudante de campo era o coronel António Joaquim Garcia (Comandante-Geral da Guarda Policial)
Sobre Vicente Nicolau de Mesquita ver:
https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/vicente-nicolau-de-mesquita/
[…] em Bronze, Memórias de Macau. Livros do Oriente, 2001, 168 p. + |6|. ISBN 972-9418-88-8) (1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/03/19/noticia-de-19-de-marco-de-1880-tragedia-em-macau-vice… (2) TEIXEIRA, P.e Manuel – Vicente Nicolau de Mesquita. Macau, 2.ª edição, 1958, 98 […]
[…] (8) Ver: https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/03/19/noticia-de-19-de-marco-de-1880-tragedia-em-macau-vice… (9) Refere-se ao romance de Eça de Queirós, “O Mandarim”. Ver: […]
[…] (1) Sobre este Governador e a inauguração da estátua equestre, ver em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/estatua-ferreira-do-amaral/ (2) Sobre o coronel Vicente Nicolau Mesquita ver em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/03/19/noticia-de-19-de-marco-de-1880-tragedia-em-macau-vice… […]
[…] em Bronze, Memórias de Macau. Livros do Oriente, 2001, 168 p. + |6|. ISBN 972-9418-88-8) (1) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/03/19/noticia-de-19-de-marco-de-1880-tragedia-em-macau-vice… (2) TEIXEIRA, P.e Manuel – Vicente Nicolau de Mesquita. Macau, 2.ª edição, 1958, 98 […]
[…] (5) https://nenotavaiconta.wordpress.com/2013/03/19/noticia-de-19-de-marco-de-1880-tragedia-em-macau-vic… […]