A propósito duma notícia publicada no JTM (1) “MacauFotoBios arranca com José Vicente Jorge”, e para salientar a importância dos sinólogos macaenses, e o papel importante (e pioneiro) da Repartição Técnica do Expediente Sínico (2) no ensino e formação dos intérpretes – tradutores, fez-me “vasculhar” (e reler, sempre com muito interesse) o livro de J. V. Jorge (3):
新讀本
SAN-TOK-PUN
NOVO METHODO DE LEITURA
Mandarim |
Tradução |
Cantonense Jyutping |
xin | novo, recente, moderno | san1 |
dú, dòu | ler, estudar | dau6, duk6 |
ben | raiz, origem, classificador para livros | bun2 |
Trata-se de um livro com ensinamentos (“novo método“) de aprendizagem do cantonense (escrito e falado), adaptado pelo sinólogo José Vicente Jorge (1872-1948).
A propósito deste macaense, que foi tradutor da Embaixada de Portugal em Pequim, chefe de Repartição de Expediente Sínico em Macau, colecionador de Arte Chinesa e amigo de Camilo Pessanha, transcrevo do jornal Ponto Final (22 de Abril de 2010) “Vida e obra de José Vicente Jorge“, o seguinte (3):
«Nascido em Macau em Dezembro de 1872, José Vicente Jorge entrou para a Repartição do Expediente Sínico em Março de 1890, seguindo o exemplo do pai, que fora intérprete-tradutor. À época, explica Tereza Sena, os intérpretes asseguravam a diplomacia no dia-a-dia da cidade, lidando ainda com assuntos relacionados com a população chinesa, que constitua a grande maioria. “Estes intérpretes eram muito importantes para a economia e manutenção da estabilidade de Macau”, acrescenta a historiadora.
Pelas suas funções de intérpretes, professores e diplomatas, homens como José Vicente Jorge eram os responsáveis pela mediação cultural entre os dois mundos em que viviam: o português e o chinês. José Vicente Jorge contribuiu para este entendimento, nem sempre fácil, de forma notável.
“José Vicente Jorge revelou os segredos da poesia chinesa a Camilo Pessanha, tendo posteriormente trabalhado em conjunto nas traduções, bem como os segredos da arte chinesa que ambos coleccionavam. Por esta razão, os escritores portugueses Camilo Pessanha e Wenceslau de Moraes permaneceram na família Jorge como homens sensatos, dignos de respeito e de honra”, conta Tereza Sena.
As privações e atribulações da Guerra do Pacífico levaram José Vicente Jorge a procurar abrigo em Portugal, onde viria a morrer vítima de diabetes em Novembro de 1948, longe da terra natal que tanto estimava. Não voltou a ver Macau, mas conseguiu transmitir aos seus descendentes a afeição pela cidade onde nasceu e o carinho pelas culturas que soube entender.
“José Vicente Jorge viveu coerentemente e de forma honrada numa difícil época de transição à escala mundial: da monarquia à república, da democracia à ditadura, da paz à guerra, do colonialismo ao despontar dos nacionalismos, mas também de profundas e instáveis alterações na vida quotidiana a caminho da modernidade, que num século de tantas mudanças não deixou Macau de fora”, remata a investigadora.»
O livro já “velhinho”, com muitas páginas “ratadas” (por traça?), algumas parcialmente rasgadas, outras coladas com fita cola, de 25 cm x 17 cm, dá-nos uma ideia de como era transmitido, nessa altura, o ensino do chinês (cantonense) em Macau. Este é o 1.º livro dum projecto que teria VIII volumes (4), e tem uma lombada de cor vermelha.
Tem no verso da capa uma assinatura “Macau, 6 de Setembro de 1928, João Siu”
A mesma assinatura na 1.ª folha, em branco mas com data diversa “Macau de 5/9/1928, João Siu” e no verso da contracapa, a lápis, “João Siu, Macau 4 de Setembro de 1928”
Como curiosidade, embora na capa indique 1908, na página I (o livro tem no início, uma numeração romana de I a XXV) traz a indicação de 1907.
A Metodologia adoptada era, em cada lição, apresentação de um texto em chinês (da direita para a esquerda) (a 1º lição, mais elementar e simples, aumentando progressivamente de dificuldade e complexidade com as lições posteriores), a tradução por cada caractere e a tradução da “frase” com notas explicativas no final.
NOTA: A propósito da colaboração com Camilo Pessanha, transcrevo de Daniel Pires (5)(6):
“Um dos ensaios atribuído a Camilo Pessanha de 1915 – Kuok Man Kan To Shu – Leituras Chinesas (referenciado como livro escolar, em colaboração com José Vicente Jorge), na verdade, é um manual elaborado por José Vicente Jorge destinado a portugueses que se dedicavam à aprendizagem do mandarim, pertencendo a Camilo Pessanha a revisão das expressões portuguesas que o constituíam ”
Poderá obter mais informações sobre este sinólogo em:
http://macauantigo.blogspot.com/2009/04/jose-vicente-jorge-1872-1948.html
http://macauantigo.wordpress.com/2011/04/
http://macauantigo.blogspot.com/2012/01/notas-sobre-vida-de-jose-vicente-jorge.html
(1) Jornal Tribuna de Macau, 28 de dezembro de 2011
(2) PAIVA, Maria Manuela Gomes. Traduzir em Macau. Ler o outro – para uma história da mediação linguística e cultural
http://www.google.pt/#hl=ptPT&cp=28&gs_id=3f&xhr=t&q=Reparti%C3%A7%C3%A3o+E
xpediente+S%C3%ADnico&pf=p&sclient=psy-ab&source=hp&pbx=1&oq=Reparti%C3% A7%C 3%A3o +Expediente+S%
(3) JORGE, J. V. (traduzido e annotado por) – Novo Methodo de Leitura, 1.º Livro. Macau, 1908, Typ. Mercantil de N.T. Fernandes e Filhos, 75 p. + XXV p.
(3) http://pontofinalmacau.wordpress.com/2010/04/22/vida-e-obra-de-jose-vicente-jorge-no-albergue/
(4) Na última página (p. 75) do livro, tem a seguinte indicação:
“No prélo:
Novo methodo de leitura, Vol. II e III.
Em preparação:
Vol. IV. V. VI. VII. e V”
Não consegui obter informações se os 8 volumes foram todos impressos.
(5) PIRES, Daniel – Apresentação: Camilo Pessanha: Biblioteca Nacional de Portugal in
http://purl.pt/14369/1/cronologia1927.html
(6) Kuok Man Kau Fo Shü – Leituras Chinesas (trad. .Camilo Pessanha e José Vicente Jorge), Macau, Editora da Typographia Mercantil da N. T. Fernandes e Filhos, 1915
[…] e Filhos, 161 p. (2) Sobre o 1.º livro e referências ao autor , ver anterior “post”: https://nenotavaiconta.wordpress.com/2012/01/18/leitura-novo-methodo-de-leitura-i/ (3) Na última página (p. 161) do livro, tem a seguinte indicação: “No prélo: Novo […]
[…] Filho de José Vicente Jorge , que tem um retrato a óleo deste mesmo Fausto Sampaio) (ver em: https://nenotavaiconta.wordpress.com/2012/01/18/leitura-novo-methodo-de-leitura-i/ ) Foi o presidente da delegação de Macau à 1.ª conferência do Império Colonial Português […]